1989
No gozo deste amor, sinto vertendo
Em fozes tão diversas, sentimentos;
Ternuras e carinhos: condimentos,
Aos quais não faço algum, sequer, adendo
Quereres e vontades me envolvendo,
A vida se permite aos meus intentos
E prometendo assim novos inventos
Alentos em delírios; sempre tendo.
Recolho meus pedaços e refaço
De tudo o que eu perdera, trama e laço
Regaços em palavras carinhosas.
Levando desde agora a paz suprema
De quem não tendo à vista algum problema
Imagens em delícias graciosas...
1990
Imagens em delícias graciosas
Formando em rosicler o entardecer.
Aos poucos recomeço a perceber
As maravilhas espetaculosas
Fantásticas deidades fabulosas
Embotando olhares no prazer
Que tantas vezes sinto a se verter
Espalhando em canteiros frágeis rosas.
Na lânguida expressão, fátuo desejo.
Anseios tão etéreos que prevejo
Domínio dos sentidos, abandono.
Atrevo-me a pedir estrela e luz
Dourando belos corpos seminus
Ganhando os infinitos perco o sono...
1991
Ganhando os infinitos perco o sono,
Num átimo viajo por espaços
Momentos tão profanos e devassos,
Divinas conjunções eu espiono.
Amor, dos sentimentos, o patrono,
Que mesmo em suprimentos mais escassos
Reúne novamente os meus pedaços
Tramando a primavera em pleno outono.
Ao ouvir o chamado dos arautos
Até os distraídos, os incautos
Percebem o poder que emana de Eros.
A bordo desta fabulosa barca
Minha emoção, a fantasia abarca
Sonega outros tormentos, frios, feros...
1992
Sonega outros tormentos, frios, feros
Revelação trazida pelo sonho.
A cada amanhecer me recomponho
Vivendo estes momentos insinceros.
Os dias prosseguindo assim, austeros
O tempo não promete ser risonho.
O quadro se apresenta então medonho,
Embora com cuidados, vãos esmeros
Caricatura apenas do que fomos,
Engodos que às verdades contrapomos
Não deixam que se pense com clareza.
É necessário sempre ter coragem,
Quem sabe ao refazer nossa viagem
A glória se perceba em farta mesa.
1993
A glória se perceba em farta mesa
Àquele que se mostra destemido
Dever que com clareza está cumprido
Não deixa ao fim da tarde uma surpresa.
Porém é necessário o que se preza
Negando um descaminho concebido
Fadando ao desamor; inglória e olvido
Não sendo da tristeza simples presa.
Se a lua e merencória e o dia é vago
Pensando no que fomos eu divago
O afago da saudade traz desprezo,
A vida vem soltando todo o peso,
Marcando a minha cútis, cada ruga,
A lágrima que trago não se enxuga.
1994
A lágrima que trago não se enxuga,
Também a vida traz em artimanhas
As mais complexas ditas, velhas sanhas,
Preconizando ao fim, temor e fuga.
Amor quando em tristezas se conjuga
Adentra com vigor nossas entranhas
Ao mesmo tempo queres e me estranhas,
O pensamento audaz não se subjuga.
Vestido da esperança, eu sigo em luta,
Batalha interminável, mas querida.
A cada nova trama em trégua urdida
Permite uma estratégia. A mão astuta
Ao me acariciar, cedo apunhala.
Deixando sem sentidos minha fala.
1995
Deixando sem sentidos minha fala,
O amor quando entontece; o que fazer?
Aberrações diversas passo a ver
Tomando com certeza quarto e sala.
Por vezes a ilusão já me regala,
Depois escuridão a refazer
O passo que entre trevas se fez crer
Multiplicando
Escalas tão diversas, versos, veios,
Fagulhas incendeiam meus anseios
E nada do que colho, eu semeara.
Desertificação nesta seara
Que um dia fora glória e agora é nada.
A noite se faz logo anunciada...
1996
A noite se faz logo anunciada
Crepúsculo em minha alma. Vou vazio.
De todos os meus passos, perco o fio
Só resta o que eu não quis. Vida farpada.
Adentro em noite escura a vã estrada,
A solidão acende o seu pavio
O tempo se mostrando mais sombrio
Sonega o que tentei ser alvorada.
Meticulosamente inda recolho
Tentando me livrar de cada abrolho,
O trigo se perdeu. Amor sendeiro
Desprezível, voraz, negando a sorte
Apenas restará no fim, a morte
Orgástica ilusão, bem derradeiro...
1997
Orgástica ilusão, bem derradeiro,
Cevada pela vida. Meu estertor
Vibrando com seu ar encantador
O corte se aprofunda, alvissareiro.
O corpo se apodrece por inteiro
E traz o mais profano e puro ardor,
Sentindo minha tez se decompor
Preparo em solidão este canteiro
Aonde poderei ser mais feliz,
A lua se desnuda, meretriz
E deita em prata um fogo inebriante.
Incrível que pareça, neste instante
Minha alma libertária enfim se eleva
Buscando em teimosia, paz na treva...
1998
Buscando em teimosia, paz na treva
Durante tanto tempo eu me embebi
De todo este vazio que há em ti
O sonho em pesadelo vão me leva
Fazendo na esperança torpe ceva
Eu quis o que tentara e já perdi
Apenas teu retrato, então eu vi
Minha alma, mansamente então se neva.
Releva a cada passo, o meu falseio,
E embora na ilusão, ainda veio
Um único momento de alegria
Sorrindo em desdentada maravilha,
Espaços sem limites, o caos trilha,
Surpresa transtornando em ironia.
1999
Surpresa transtornando em ironia
Cadáveres pesando em minhas costas.
A par do que sonegas, corta em postas
E o tempo em abandono, o sonho cria.
De tudo o que talvez, o amor sabia
Errôneos descaminhos, dor reposta
A vida não duvida nem aposta
O que me restará? Vã fantasia...
Funérea tempestade eu vejo ao longe,
Coração solitário feito um monge
Não vê mais esperanças, segue ao léu.
A adaga em tuas mãos, bem escondida
Promessa sorrateira de ferida
Cumprindo em louca sina, o seu papel...
2000
Cumprindo em louca sina, o seu papel,
A amargura de tentar e não saber
O quanto se mostrou em desprazer
A vida sonegando um claro céu.
Minha alma se confunde na Babel
Dos sonhos, pesadelos, dor, poder,
Em cego destempero, passo a ver
Derradeiro sorriso, ateu, incréu...
Vestígios de mim mesmo pelas ruas,
Caridosa manhã, belezas nuas
A praia se desfaz do velho mar.
Areias movediças entre pedras.
Esperanças sutis que logo empedras
Veredas que não posso mais buscar...
2001
Veredas que não posso mais buscar,
Hediondas colheitas prometidas
Hedônicas manhãs, mal divididas
Deixando uma esperança me lograr.
Quem dera uma alegria como altar
Tomasse em procissão as nossas vidas,
Entraves e barreiras esquecidas
Na trilha feita em paz, recomeçar.
Porém percebo ser um disparate
Do amor, este falsário e podre vate
Nas teias tão ingratas: ilusões.
Noctâmbulo fantasma de mim mesmo,
Andando pelas ruas, prossigo esmo
Lutando contra o fogo das paixões...
2002
Lutando contra o fogo das paixões,
Diversas vezes tive o desprazer
Da solidão a dois reconhecer
Secando o que pensei inundações.
Do quando se fizeram negações
Os dias que pensara em bem querer
Espalham sobre nossos corações
O medo de sonhar e de viver...
Depois de tantas farsas e mentiras
Distantes emoções, vazios miras,
E o nada em sofrimento, ora desvendo
Restando a solidão em nossas vidas.
As lágrimas terríveis e doridas
No gozo deste amor, sinto vertendo.
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