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Saturday, August 26, 2006

Cordel - A minha sina - capítulo 2 - Jacinta

Marina, minha menina,
Safada como ela só;
Na minha vida deu nó.
Depois da mão assassina,
Continuei minha sina;
Em busca do meu caminho,
Mas dei tempo, fiz um ninho;
Com Marina fui morar,
Tanto prazer para dar,
Por que vou ficar sozinho?

O doutor nem me pagou,
Nem precisava pagar;
Marina foi no lugar,
Foi tudo que me restou;
E, de novo, aqui estou...
Na cama dessa pequena,
Que faz bico e que faz cena;
Pronta para me engrupir,
Bastava só me pedir,
Rezava até em novena...

Mas, num dia de tristeza,
Por causa de romaria,
Cismou de ir com Maria;
Filha da dona Tereza,
Que fez voto de pobreza;
Duma forma diferente,
Dando pra todo vivente,
O que Deus lhe deu com fé,
Ia a cavalo ,ia a pé;
Toda noite um diferente...

Juntando pólvora e fogo,
O troço todo fedeu;
Marina, então se esqueceu,
E mesmo com todo rogo,
Fugiu com um tal Diogo;
Sem deixar rastro e sinal,
Juntei então no bornal,
E pra outras cercanias,
Em busca das valentias,
Recomecei meu jornal...

Nessas estradas mineiras,
Sem ter medo mais nada;
Na serra ou noutra baixada,
Fiz das rimas verdadeiras,
As ramas foram esteiras,
Onde dormi sem ter medo.
Desse meu novo degredo,
Exilado sem ter casa,
Meu peito ardendo na brasa,
Na solidão, meu segredo...

No bornal levo cachaça,
Três pistolas carregadas,
Luares e madrugadas,
Que é coisa que dá mais graça,
Cigarro prá ter fumaça;
Um monte de valentia,
Um novo romper do dia,
Quatro mortes nas “costa”
Três foram de pau de bosta,
Que nem pra bosta servia...

Num canto desse cerrado,
Onde vi onça pintada,
Pelas ribeiras, jogada,
Tudo me foi preparado
Encoivarei um roçado,
Das coisas que sei plantar,
Quiseram me contratar,
Pra fazer mais três “defunto”,
Que, pra terra de pé junto,
Era fácil de levar...

O serviço foi moleza,
Eles morreram no susto,
Tavam atrás dum arbusto,
Se borraram na certeza,
Nem me causaram grandeza.
Servicinho mais vulgar,
Mas deu pra comemorar,
A filha dum tal meeiro,
Nunca vi, no mundo inteiro,
Uma beleza sem par...

Jacinta, a moça chamava,
Tinha um rosto mais perfeito,
Tudo que tinha direito,
A moça tinha e sobrava,
Mas eu nunca imaginava
O que tinha diferente,
Pois se toda aquela gente,
Ninguém me contava nada,
Por que estava, ali, jogada,
Uma moça, assim, ardente...

Sem querer saber por que,
Não me importava a peleja,
Pois quando um homem deseja,
Nada pode convencer,
Não há do que se temer,
Nem há o que perguntar,
É só correr e pegar,
Pois, na vida o que é do home,
Nenhum bicho vai e come,
Nem preciso comentar...

Pois bem, essa tal Jacinta,
Tinha a beleza da flor,
Nem conhecera o amor,
Não procurou fazer finta,
Fui pintando, tanta tinta,
Sem licença pra pedir,
Chegando, fui conferir,
A moça bem de pertinho,
No seu colo fiz um ninho,
O seu cheiro quis sentir...

A moça ficou só no beijo
Não aceitou meu carinho,
Que, mesmo indo de mansinho,
Acendendo seu desejo,
Me deixou só no cortejo,
Fechando as pernas pra mim,
Pensei logo ser assim,
O jeito dessa donzela,
Que depois, numa esparrela,
Ia tintim por tintim...

Depois de tanto alvoroço,
Sem dar ouvido a ninguém,
Que quando a gente quer bem,
Angu não tem nem caroço,
A gente mergulha no poço,
Sem saber profundidade,
Nem pergunta da maldade,
Nem quer saber de mais nada,
A moça, perna fechada,
Parecia santidade...

Mas, depois de três semanas,
De tanto rala e não abre,
Mostrei a ponta do sabre,
Os olhinhos mais sacanas,
Que engana mas não me enganas;
Jacinta não resistiu,
De beijos, então cobriu,
Fez que teve uma vertigem,
Surpresa: não era virgem,
Onde entra um entra mil...

Quis saber dessa safada,
Por que foi que me fechou
Porteira por onde entrou,
Um boi, talvez a boiada,
Ela então, desesperada,
Me disse bem deslambida,
Que nunca na sua vida,
Ela poderia ter,
Um outro amor pra viver,
Sua sorte era perdida...

Me contou: quando menina,
Com doze anos de fato,
Deitada nesse regato,
Que a lua mais ilumina,
Nessa água tão cristalina,
Foi, um dia, se banhar,
Mas não podia esperar,
Que toda nua, e bonita,
O coração que s’agita
Nunca iria imaginar...

Na margem daquele rio,
Um moço que lá chegava,
Belo cavalo montava,
Um príncipe em pleno cio,
Enchente em tempo de estio,
Não conseguiu resistir,
A boca então quis abrir,
Num solavanco com força
Ali, acabou-se a moça,
Se deixando possuir...

Acontece, não sabia,
Que esse príncipe fajuto,
Era o safado dum bruto,
Que não tinha serventia,
A não ser na sacristia,
Que tristeza dessa sina,
Quando tirou a batina,
O padre por pilantragem,
Fez tremenda sacanagem
Com essa pobre menina...

Saiu correndo depressa
Mal completou o contado;
Eu fiquei descompassado,
Com toda aquela conversa,
A quem quer que isso interessa,
Vou contar bem devagar,
Nessa noite de luar,
Vendo de novo essa cena,
Ouvi de longe a pequena,
Num lamento, relinchar!

Sai correndo ligeiro,
Deixei tudo de empreitada,
E, naquela madrugada,
Naquele triste janeiro,
Perto daquele ribeiro,
Antes que a terra me engula,
Só falar, coração pula,
Te juro e falo verdade,
É pura realidade:
Eu tinha comido a mula!

Quadras em decassílabo - Teu retrato

Quando enfim encontrei o teu retrato,
Descorado e jogado na gaveta;
Assinado seu nome, com caneta,
Percebi com saudade, fui ingrato...

Tinhas um olhar triste e tão distante,
Como quem procurasse amor, prazer;
Ou quem sabe, somente, reviver,
Tantos sonhos perdidos, e bem antes...

Não podia sonhar d’outra maneira,
Quem a vida feriu e maltratou;
Tua fotografia me mostrou,
Tanto amor que viveu, a vida inteira...

Me recordo das noites que passamos,
Nossas camas, sentidos e visões;
Em um só, transformando os corações.
Hoje eu bem sei o quanto, nos amamos..

Em teu corpo desejos eram vias,
Tuas mãos delicadas mil delícias,
No sofá, nossa cama, das carícias
Que trocamos, fantásticas orgias...

Teu colo, âmbar , beleza sem igual.
Nos desfiles nas nossas loucas noites,
Nossas línguas desciam, qual açoites
Que traziam eterno carnaval...

Quanto tempo passado, vou sozinho,
Minha cama jamais teve outro alguém;
Procurei sem saber, um novo bem,
Todo mundo passando, eu passarinho...

Na procura silente, quero crer,
Que tal mel, tua boca, só me traz.
Perseguido e tentando ser capaz,
De encontrar outr’amor para viver...

Encontrar teu retrato foi doído
Desespero tomou tudo d’assalto;
Como pude tentar, sou tão incauto
Reviver esse tempo já vivido...

Nunca mais reviver a tua foto,
Nem revirar gavetas, nem passado.
Me perdoe, se tanto andei errado,
Minha vida,um retrato tão remoto...

Triste Sina

Tua sina, querido companheiro,
Com certeza, jamais foi invejada.
Começou, desde início, malfadada...
Teus irmãos dominaram mund’inteiro.

Te restando as profundas; foste herdeiro
Do que nunca, ninguém, quis como estrada...
Dos mortos, o teu reino era entrada,
Da grande Proserpina, amor primeiro.

O teu destino triste, desgraçado,
Achavas que seria teu legado.
De Júpiter, Netuno, foste irmão.

Dos mortos, teu reinado, e possessão.
Isso não bastaria a ti, Plutão;
Depois de tanta glória, rebaixado...

Telefone tocando, novamente

Telefone tocando, novamente;
Preciso dormir, quero e necessito.
Mas como conseguir com esse grito
Infernal que transtorna minha mente...

Madrugada transcorre normalmente;
Não fora tão somente esse maldito,
Que com seu infernal e cruel rito,
Repetindo a chamada, vil demente;

Não deixa descansar quem trabalhou,
Quem, durante, esse dia, labutou;
Para o sustento e glória da nação!

É, mas não tem mais jeito: a solução
É receber maldita ligação...
Alô! Quem é? Responda! Se enganou...

Sentimento mordaz que me metralha

Sentimento mordaz que me metralha,
Não me deixa, sequer, nem respirar;
Na vadia tortura, procurar,
Por alguém que, feliz, tanto atrapalha...

Teu sorriso transforma-se em mortalha,
Machucando feroz, quem quis um par;
Vagabundo serei, não vou parar,
Me contento em fugir dessa navalha...

Sentimento safado,vive tonto;
Aumentando, cruel, ponto por ponto,
Vazia sensação de ser abjeto...

Não sou nem a metade, simples feto
Que procura crescer; tolo, incorreto,
E nunca estará, para a vida, pronto...

Almíscar: meus desejos, teu perfume

Almíscar: meus desejos, teu perfume;
Penetrando as narinas, me conquista.
E não há, na verdade, quem resista,
Nem quero e nem concebo mais queixume...

A vida sem teus olhos, não tem lume,
Meu caminho se perde. Não desista:
Grito contido, perco-te de vista.
Mas teu olor suave, qual costume,

Denuncia teus passos, minha amada...
Não perderei jamais a tua estrada,
Nem quero mais sentir outro desejo.

Teu perfume causando, nesse ensejo,
A doçura suave de teu beijo,
Presença do Senhor, glorificada...

Nessa minha oração, peço perdão

Nessa minha oração, peço perdão;
A quem, por amor, sigo meu caminho.
Quem me fez contemplar, e sou daninho,
Andorinha sozinha, no verão...

Quem me trouxe, certezas, por paixão,
Me embriaga, bebendo verde vinho.
Fermentando, devora, vagarinho,
Tudo o que restou. Sem solução...

Vindo da noite, gritam pesadelos,
Como viver melhor, não quero tê-los,
Mas, mal fecho essa porta, a força bruta...

Amor, transfigurado, nem me escuta,
Cansado, vou vivendo essa labuta,
A minha vida envolta em tais novelos...

Quantas vezes, na noite, me desperto


Quantas vezes, na noite, me desperto;
Acordando, procuro por você;
Com certeza, sedento de prazer,
Muitas vezes, sofrendo, estou bem certo...

Mas estás, assim, distante mas tão perto,
Aguardando-me, enfim. Sobreviver
Nessa vida improvável, quero crer
Que te tenho comigo, tão dileto...

Eu não sei mais porque tanto m’agarro
Só nessa perspectiva, tudo varro:
Tristezas, agonias, sofrimento...

Quem me dera poder ter teu alento,
Onde esperança teima novo intento;
Em tua brasa acesa, meu cigarro...

Quando ando sozinho, sem destino

Quando ando sozinho, sem destino,
Procurando saber da liberdade,
Vasculhando por toda essa cidade,
Percebo, pois, o quanto eu sou menino...

Muitas vezes, me julgo qual felino;
Entretanto sou manso, na verdade,
Queria transformar a realidade.
Mas, calado, vivendo, descortino

Tremenda mansidão, que me tortura,
Trazendo tanta angústia, peço cura;
Nada encontro, senão um doce canto.

Quem me dera poder ter tal encanto,
Que se encontra na luta, caos e pranto.
Mas meu Deus, me legou tanta brandura...

Salmo 3

Os meus adversários nesse mundo,
Aumentam toda dia e todo instante;
E tentam impedir, isso é constante,
Amor por Deus, gigante e tão profundo....

O Senhor me sustenta d’alegria,
O Temor vai distante, pois eu creio;
A salvação que escolho, vem por meio
Da clemência que peço e m’alivia...

Salve-me, Meu Pai, peço tua glória;
Feriste os inimigos nos seus queixos.
Desses ímpios, seus dentes, com mil seixos,
Quebraste e não deixaste nem memória...

Salmo 2

Os povos imaginam coisas vãs,
Amotinam-se contra o Criador;
Acreditam poder, sem meu Senhor,
Dominar, sem temor, suas manhãs!

O Meu Pai, conhecendo tais gentios,
Sabedor dos desejos mais secretos;
Me dá forças maiores, pois são retos,
Os caminhos que levam; desafios...

Pobres reis que renegam Nosso Deus,
Seus destinos não trazem temperança;
Os seus povos serão maior herança,
E os fins da terra, todos, serão meus...

Pois meu Rei foi ungido, com amor,
Sobre o Monte Sião com alegria;
E como todo aquele que confia,
No nosso bom Senhor, vivo temor!

Salmo 1

Uma árvore plantada junto ao rio,
Tem flores, frutos, fortes com certeza.
Agora o coração que vai vazio ,
Não traz, em si, nenhuma realeza...

Os ímpios tanto falam e não procuram
Os caminhos e sendas do Senhor,
Não sabem discernir o que é amor.
Depois, sem ter perdão, jamais se curam..

O vento espalha, sempre, a boa nova,
Os ímpios, no juízo, não prosperam.
Os frutos bons, que tanto bem fizeram,
O rumo da justiça; se renova...

Friday, August 25, 2006

Quadras em decassílabo - Meu Amor

Amor, minh’alma triste te procura,
No amanhecer da vida foste fera;
Agora que, saudade já impera,
A noite se aproxima, mata escura...

Num momento feliz, foi tão amigo;
Mas a vida transforma toda gente,
E depois, tão cruel, foi diferente,
A paz, então, jamais vive comigo...

Sentir a baforada dessa boca,
Que acalenta a dor, vero sentimento;
É conseguir suprir meu pensamento,
Dessa ternura audaz, a voz mais rouca...

Amor quimera, mera diversão,
Que maltrata quem sonha liberdade;
Tão faminto, traduz voracidade.
Começa a devorar, sem ter perdão...

Amor, é doce fruta que envenena,
E vicia quem dela for provar;
E bêbado, tropeça no luar,
Agiganta a que fora tão pequena...

Nos lábios, minha amada, meu desejo;
Um resto de ilusão bate na porta.
Contigo, essa tristeza já vai morta,
No cálice fantástico do beijo...

Teus olhos, são promessas d’esperanças,
Num tempo mais feliz da minha vida.
Seus brilhos iluminam a avenida,
Por onde caminhávamos, crianças...

Nos teus cabelos trazes maciez,
Que minha mão jamais vai esquecer;
Neles, vou embrenhar-me e conhecer,
O que fora da glória, essa altivez...

Em teu pescoço; jóias e colares.
Em teu louvor cantar todos os hinos,
Buscando, nos teus olhos cristalinos,
A força que leva aos teus altares...

Beber de teu sorriso tanto mel,
Saber de tuas noites orvalhadas;
Sonhar contigo minhas madrugadas,
Por ti, agradecer a Deus do Céu...

Amada, tão risonhos os meus dias;
Desde o momento mágico que tive,
Felicidade igual onde, sei, vive
Os pássaros que encantam, melodias...

Teus pés de tão macios e pequenos,
São obras d’arte feitas com louvor;
Por quem foi o mais mágico escultor,
Que por inspiração, não fez por menos...

E caminhas? Flutuas pelos ares,
Teus passos são concertos orquestrados;
Meus olhos na procura, extasiados,
Desejam conhecer os teus altares...

Quadras em decassílabo

Meu amor se escondendo faz doer,
O que jamais senti por essa luz.
Amor só, sem amores, não seduz,
Nem mesmo me dá forças p’ra viver...

Num barco se navego, sou distante;
Na vida sem ciúmes tenho medo.
Quem sabe do meu parto, meu degredo,
É quem me permitiu ser inconstante...

Na mata tem palmeiras, tem Palmares,
No campo tenho flores impossíveis.
Amores são deveras insensíveis,
Procuro por amor, noutros lugares...

Setembro já me trouxe primavera;
As flores que brotaram nessa mata,
Misturam-se no belo da cascata.
Amores de verdade, quem me dera!

Tenho mudanças nessa minha vida;
Que não consigo máximo nem tédio,
A vida transbordou esse remédio,
Amor é uma cantiga despedida...

No beijo de Maria sei Dolores,
Nem quero pressentir tanta mudança;
Quem me dissera lúdica esperança,
Murchou num triste vaso sem ter flores...

Num momento de glória quis Jesus,
Que o perdão fosse enfim, uma verdade,
Por isso meu amor, por caridade.
Perdão te peço, em nome dessa Cruz...

De tantas valentias que menti,
Não peço nem pergunto por que queres,
Se sabe Tiradentes, foi alferes,
Esferas são as feras só por ti...

Guardado por aqueles que não amam

Guardado por aqueles que não amam;
Aqueles cuja vida foi sem ser,
Quem nunca mais cantou não pode ler,
Verdades sem sentir já me reclamam...

Em plena madrugada vozes chamam,
Perguntam-me sem medo, pois, cadê
Aquela que ensinava-me a viver...
Meus pensamentos, cegos, tudo tramam...

Não quero mais saber das tuas flores;
Bem querer transgredido, traz mil cores
No semblante, reflexos semelhantes,

Aos que bem tarde foram tão constantes,
No mais resplandecente dos instantes,
Guardado num cruel vaso de flores...

Tanta dor, sofrimento vai cortando

Tanta dor, sofrimento vai cortando,
A tristeza da vida sem saudade.
Como dói, vai sangrando, que maldade,
Amores e distâncias, me tomando...

Eu quero, num momento, ver cantando,
Quem fora a causa; triste realidade,
E que vai me torturando de verdade...
Amores sem ter vida, me matando...

Não quero ter nem tempo nem horário,
Nem saber se sentirei, por ser contrário,
A mesma solidão que nem disfarço...

Quisera descansar no teu cansaço,
Queria conviver com teu abraço...
Meu canto, solitário, d’um canário...

A Flor do Maracujá

Quanta beleza existe nessa flor,
A natureza, capricho divino,
Num momento de raro desatino;
Para poder brindar o seu amor.

Com pincéis de raríssimo valor,
E com toda pureza de menino;
No momento de glória fez um hino.
Mostrando seu poder, Nosso Senhor.

Numa atitude bela qu’inda está
Gravada na lembrança que me dá
A medida mais certa da beleza;

No exato instante, cego de tristeza,
Nosso Senhor, com sangue e realeza,
Essa flor coloriu, maracujá...

Verdades são mentiras vespertinas

Verdades são mentiras vespertinas,
Pois muitas dessas vezes soam falso.
Aberto sob os pés, o cadafalso,
Parece que consegue essas meninas...

Num traste, traduzindo umas esquinas,
Por onde caminhavas; meu encalço...
Agora que pressinto, vou descalço,
No balanço das ruas que combinas...

Vasculho por verdades em teu rosto,
Não sinto nem procuro estar disposto;
Procurar descobrir tuas mentiras...

Dessa mesma maneira que m’atiras,
Me cortarias cedo, todo em tiras...
E devorava tudo, por teu gosto...

Cadê minha Tereza, foi pro mar

Cadê minha Tereza, foi pro mar...
Quem era ventania, virou brisa,
A morte traz medida mais precisa.
Quem fora majestade? Sem altar...

Depois dessa viagem, foi parar
Onde toda maré se torna lisa...
Tereza, bem distante, o mar avisa,
Que nunca poderei mais te encontrar...

Perdoe se não pude nem sentir
O que pensei doesse. Vou pedir
A Netuno que nunca mais te veja...

É tudo que minh’alma mais deseja,
Tua cabeça traga na bandeja;
Nem quero teu cadáver prá carpir...

Nas remessas que trazes, uma carta

Nas remessas que trazes, uma carta,
Uma mensagem triste de partida;
Avisa que terei por despedida,
As últimas notícias tuas, Marta...

Tantas vezes; Atenas, tu: Esparta.
A porta dessa entrada é de saída,
Pois quem amaldiçoa, traz ungida
A mão que acaricia, me maltrata...

No beijo; da saliva fez-se escarro,
Da lágrima sentida, tanto escárnio.
Recolho meus bagaços, meus farrapos...

Quem fora fantasia, simples trapos.
Nas mãos essas fraturas, todos carpos,
Na solidão do verso, que m’amarro...

O sal da terra trago em minhas mãos

O sal da terra trago em minhas mãos,
Vasculho, procurando em todo ser,
Quem dera poderia conhecer,
Aquele que transforma seus irmãos...

A mansidão traduz amores vãos,
Num único tormento por viver;
Instante tão feliz, novo saber.
A vida fecundando tantos grãos...

No teu martírio louvo a liberdade,
Procuro-te sem nada, sei que tarde;
Mas nunca poderei, de ti, fugir.

Castiçal de lanternas a luzir,
Um brilho sem igual, jamais vivi.
O teu nome traduz felicidade...

Nessa tristeza sinto, mesa e bar

Nessa tristeza sinto, mesa e bar,
Distâncias se completam na aguardente;
Quem me dera, poder, tão de repente,
Rever aquela boca, faz voar...

Minha cabeça roda, sem parar,
Despeço-me da pútrida serpente.
Nesse bar, melancólico e demente,
As cadeiras vazias, meu lugar...

Amei demais e sinto que perdi,
Não tenho outra verdade; pois, sem ti,
Que farei do que resta mais de mim...

Na pele, tens delícias de cetim,
Na boca, sutileza do carmim...
Pudera recordar o que vivi!

Jangadeiro que corre para o mar

Jangadeiro que corre para o mar,
Meu amor também busca por sereia;
Distante, vou sonhando nesta areia,
Nas praias onde tento te encontrar...

Saindo de manhã para pescar,
Esse sol, escaldante, te incendeia.
Saudades vai deixando, triste teia,
Que enreda quem viveu só para amar...

Na jangada, correndo com o vento,
Transportas esperanças, sofrimento;
As lágrimas sinceras que ficaram...

No retorno, tristezas se alegraram,
Outras vezes, as vidas acabaram;
E quem partiu, ficou no pensamento...

A palavra se solta, vai liberta

A palavra se solta, vai liberta,
A vida não mais pode controlar.
Tanta coisa passando por passar,
Quem me dera pudesse ser poeta...

Saberia viver forma completa,
Necessito de tanto ter lugar;
Quem fora simplesmente para o mar,
Traçando, normalmente, sua meta...

Quero o gosto das lavras e das minas,
Nas palavras que canto, cristalinas;
Existe tanta pressa de saber.

Os meus versos, embalde sem você,
São cometas; prometo, sem querer,
Laçar essas palavras tão ferinas...

Meus olhos são cascatas, a rolar

Meus olhos são cascatas, a rolar,
Chorando por quem nunca poderia,
Viver essa esperança, novo dia.
Na selva de teus olhos, vou buscar,

O tempo que não pude controlar;
A aurora que virá, mesmo tardia,
Me concedendo parte de magia.
Aurora vai chegar, tentacular...

Eu busco, nas esperas ,o teu canto;
Travando noite e dia, por encanto,
Quem sonharia parto, invés de luto...

Teus olhos tão perfeitos mas sou bruto;
Encarno a sensação, doce tributo,
De perceber enfim, teu olhar santo...

Thursday, August 24, 2006

Eu trago, nos meus olhos, a saudade

Eu trago, nos meus olhos, a saudade,
De quem jamais devia me ausentar;
Sem ela, desconheço claridade,
Sem ela, vou buscando meu luar...

Quem dera Deus tivesse compaixão,
De quem , errou na vida sem saber.
De quem somente teve sempre não,
Como resposta hostil, sem ter por que...

Não quero mais sentir a ventania,
Roçando meus cabelos, sem ter pena.
Quisera conhecer, um novo dia,
A noite, cruelmente, faz novena...

Vencido por temer guerra e fastio,
Num último poema, tento vê-la;
Sem ela, não existo, sou vazio,
Vagando, vaga-lume, quero estrela...

O zéfiro respira, me bafeja,
Transgrido as ordens, erro sem destino;
Perdido, sigo tendo essa peleja,
Perdendo meu sentido, desatino...

Quem dera se pudesse ser criança.
De novo correria para os braços;
Daquela que pensei, triste lembrança,
Um dia cerraria tantos laços...

Mas sinto que não posso resistir,
Em vão procuro tenras mansidões.
De tudo não consigo nem pedir,
Paz renovada, lastro dos perdões...

Momento atroz , penumbra d’existência,
Cartas jogadas fora, sem valor.
Te peço, tão somente por clemência,
Quem dera conhecesses minha dor...

Quiçá, então tivesses piedade,
Num último delírio dum poeta.
A vida não seria, essa verdade
Que extermina, de forma tão completa.

Amores já os tive, e os perdi,
Retratos bolorentos do passado.
Mas amar, tal qual amo, só por ti
O meu verso entoando triste brado...

Nunca mais te terei, minha centelha
Dessa luz que transporta meu desejo.
A lágrima que escorre vai vermelha,
Da boca que sonhei com tanto pejo...

Arranco dessa rosa, seu pendão,
Espinhos vão cortando os pobres dedos.
A terra vai s’abrindo, some o chão,
Em volta, nos contornos, só meus medos...

Vencido pela angústia e pelo fado,
Meus pés vagueiam loucos por estradas.
Que nunca compartilham, mesmo lado,
Seguindo paralelas, já cansadas...

Meus mares são vazios, sem marés,
A barca dos meus sonhos naufragou.
Eu pergunto a mim mesmo, se tu és
Meu todo, me responda o que sobrou?

Vivendo sem ter rumo e sem porém,
De que me serve luta sem ter glória.
Sem ter porque viver, sem ter alguém,
Meus dias vou perdendo, na memória...

Enfim, melhor morrer se não te tenho,
De que me servem festas da natura.
As matas todas, por onde eu me embrenho,
São cadafalsos, plenos d’amargura...

Te quero tão somente por querer,
Eu te fiz minha lira e minha voz.
Procurei por alhures, mas cadê?
A noite me tragou, vida feroz...

Quem sabe num momento de ternura,
Possamos reparar o que findou.
A luz, enfim, brilhando, noite escura,
Me traga essa esperança que restou...

A vida passou ávida de vida

A vida passou ávida de vida, pelo campo onde caminhava solitário.
Não quis ser mar nem ser maré, quis viver Maria, que nada mais continha a não ser poesia...
Mas me detinhas a cada passo, teu cansaço e minha sina, meu abraço e tuas pernas, penugens e paragens, margens e manhãs...
Quis ser sonho e pedregulho, ser seixo e ser queixume, deixo meu ciúme e minha cisma; cataclisma fatal sem fátuos fatos...

Num átimo um ótimo momento, um último madorno me adorno de teus ouros e perolados olhos. Nos óleos que me tramas, casas e camas, nas brasas, chamas e não respondo, oculto.
Te cultuo num duo infernal, sem eco, sem ego, trôpego, trafego e me apego a teu passo, pássaro solto, contrafeito...
Desfeito tudo que pudesse ser meu, mel e mal, Maria, o mar ia amar, andei e não te vi, bem te vi, mentiras e martírios.
Marujo sem sabujo, não sei se rei, sereia que seria minha teia, mas atéia, ateia tantas brumas, bruxuleante brisa, concisa e precisa, necessária...
Amar Maria, mar ondeia, nos seios, seixos e desejos, um beijo e um aceno, contraceno com velas e veleiros.
Nas mãos vazias, azias e ânsias, anseias seres livre, me contive e não tive outro chão...
O vão aberto sob meus pés, fendida a praia, fendida a saia, a baia, o portão...
O porto longe, a vida longe, longevidade para quê?
Na seda que roubaste e vestiste insiste meu tato, permite o olfato que, de fato serei ato, sou regato e regado a tanta maresia...
Mar se ia sem Maria, sem marés e sem viés para o invés do investido, antes tivesse ido, morrer no mar, sem Maria, sem mares, sem marés, sem poesia...

No meu cabelo ao vento, quero pente

No meu cabelo ao vento, quero pente,
Na minha mão sedenta, peço luva.
Como é cruel sentir a dor de dente,
Choveu mas esqueci meu guarda chuva...

Mordendo, teu veneno de serpente,
Quando passas, renovas passas, uva...
Como enxergo? Dos óculos és lente,
Nas baladas, embalas quando groova...

Nem versos meus, conversas jogo fora...
Na partida parida pela guerra.
Se tanto quis outrora, quero agora.

Não sei bem certo, tudo que me encerra.
Na natureza, certo és fauna e flora..
O templo mais gostoso desta terra...

Extraio poesia da cachaça

Extraio poesia da cachaça,
Num copo ressuscito tanto trago,
A vida bem melhor, dança na praça.
O resto dessa farsa, fez estrago...

Nos livros que devoro, como traça,
Reparo nos prefácios Nem indago.
Palhaço, vou temendo não ter graça,
Do que restar caduco, tudo embargo...

Na minha certidão de nascimento,
Não tive solução para o problema.
Ser filho da saudade e esquecimento,

Não quero nem desejo ser teu tema,
Vivendo por saber que casamento,
É como um ovo, feito clara e gema...

Vida vai sem sentido vai sem nexo

Vida vai sem sentido vai sem nexo,
Eu tento solução, mas não consigo,
Procuro mãos, encontro só teu sexo,
Beijando calmamente, então prossigo...

Não quero conceber pois sei complexo,
O sentimento fútil, meu abrigo,
Respondo nesta carta, vai anexo,
O que restou, guardou perfeito artigo.

Sentido cravo nesta marcação,
Embora saiba nunca deste não,
Num átimo servil, não faz sentido.

Mimosa fosse rosa o teu pedido
Me deixe ser somente teu marido,
Quem sabe irei tocar teu violão?

Minha mão passeando por você

Minha mão passeando por você,
Buscando por seus seios divinais.
Querendo, tão somente me perder,
Em meio a suas selvas, matagais...

Meus lábios, vão buscando, por querer,
Entradas e bandeiras, quero mais...
Vertendo meus desejos, vou saber,
Onde encontrar você; mananciais...

Vou descer, mansamente, cachoeira;
Que em meio a suas pernas, incendeia.
Saber lhe conhecer, viver, inteira.

Intensas as fogueiras que incendeia;
Não quero nem saber da verdadeira
Morfina; seu amor, em minha veia...

Bastam-me mais uns poucos sentimentos

Bastam-me mais uns poucos sentimentos,
Não quero transformar tristeza em ouro.
Minha história não cabe tais momentos,
Essa faca penetra no meu couro...

Arrebentando tudo, seguem lentos,
Meus cruéis guias, sabem dess’agouro.
Nada seria nem sérios os ventos
Que me retornam, livre matadouro...

Me deixaram saber que não partilhas,
De minha sina, víbora-veneno.
Nem os teus cães, caçando nas matilhas,

Conseguem penetrar meu sonh’ameno...
Fugindo sem parar, quer’essas ilhas,
Que me dariam, sono mais sereno...

Meu amor, não saber por onde anda

Meu amor, não saber por onde anda,
Embriagado, restam-me tremores.
É jóia rara, como um urso panda,
Quem me dera sentir perfume e flores...

Sua festa, clarins tocam na banda;
Nas ruas, alamedas dos amores...
Tanto quero, liberto-me em Vanda,
Seus caminhos, por onde vai, olores...

No sentimento, lúdico, d’amor;
Por um momento, vértice de luz,
Vanda me faz sentir por onde for,

A vida leve, é breve minha cruz,
Deste cenário, sigo sendo ator,
Ao fundo um cego, triste, toca blues...

Participo de todo este cenário

Participo de todo este cenário,
Na procura de nova solução
Se vivo, não sou canto nem canário.
Nem quero ser problema nem senão...

Sou vertigem sentido e campanário,
Muitas vezes prendi porta e porão,
Não temo nem sequer sou temerário...
Calha quebrando encalha o coração...

Vate sem termos tento ser poeta,
Nessa busca incansável pela musa,
Minha noite sem horas, sei completa,

Nos cabelos, serpentes, és medusa.
Nos teus olhos, carpidos, sangue injeta.
Que delícia: tirares tua blusa...

Sensual, teu corpete cor de rosa

Sensual, teu corpete cor de rosa,
Fazendo delirar minha libido.
O olhar deliciado, faz que goza,
Em tal emaranhado, sem ter lido

Sequer algo que fosse nova prosa.
Amor, batendo forte, descabido,
Tritura tantas manhas, antegoza,
Do que mais poderia ter sentido...

Teu corpete caído no sofá,
Esquecido, traduz os meus anseios.
Como que se pudesse, estando lá;

Acariciar, toda, sem rodeios,
Essa bela mulher, gata angorá,
Dos seios que permitem devaneios...

Vai chovendo confetes sobre mim.

Vai chovendo confetes sobre mim.
Na festa, pela fresta da janela,
Tanto ser pierrô , ser arlequim,
Saudades são tão minhas quanto dela...

Não quero carnaval, nem mesmo assim,
Tampouco vou saber ser sentinela,
Dessa rosa que morre, cor carmim,
Nas manhãs, que me devora, singela...

Rompe dia, sem tento nem sustento,
Teu grito, colombina, foi engano.
Se matasse, veria cortar lento,

O que me dera, solto, simples plano,
Que me deu conforto, mais de cento,
Meus amores estragam e eu m’abano...

Me dê tuas mãos, vamos procurar

Me dê tuas mãos, vamos procurar,
Nos espaços celestes, nossa cama.
Quem sabe bem por onde começar;
Conhece, dos amores, toda a chama...

Vamos nessas galáxias, luar,
Procurar nos cometas todas tramas
Que, sem sentir, passamos a vagar;
Nas florestas divinas tantas ramas...

Vamos em busca do sonho perdido,
Onde nunca mais quero ver ocaso.
Meu mundo, tempestades, dividido.

Entre tantas certezas e o acaso,
Eu sou o alvo, flechado por Cupido,
Sem ter rumo, sem meta, sem ter prazo...

Cordel - A minha sina - capítulo 1 - O coronel e o doutor


Vou curvando minha vida,
Nas capotadas da sorte,
Perdoando até a morte,
Que sei que traz despedida.
Minha sina, minha vida,
Carrega tanta certeza,
De fundear a tristeza,
De trazer pano pra manga,
A morte, minha capanga,
Flutua desta leveza.

Fiz parto de sucuri,
Namorei onça pintada,
Minha sorte não foi nada.
Carreguei o que perdi,
Travei luta e não venci.
Deu empate nessa joça.
Fiz uma nova palhoça
Para morar com você;
Queria lhe conhecer,
Plantei uma nova roça.

Você foi minha quimera,
Não conheci sua manha,
Minha lida foi tamanha,
Dentro da minha tapera,
O sal da vida tempera.
Plantei feijão, plantei milho,
Plantei, em você, um filho.
Fiz da lenha essa fogueira,
Minha velha companheira,
Só tem cano e tem gatilho.

As armas da solidão,
São as mesmas que disparo,
Com meu amor, eu deparo,
Nas rotas do meu sertão,
Bebo o sim, conheço o não.
Vadiando sem parar,
Sem ter nem onde chegar,
Sou um passo da saudade,
Vou mesmo sem ter vontade,
No sertão virando mar...

Cravo dente na maçã,
Da cara de quem me escarra,
Tenho dentes tenho garra,
A vida segue mal sã.
Tem tempero d’ hortelã...
Nas enchentes da ribeira,
Desabou a barranceira,
E cobriu casa e estradão,
Nada restando, senão
Uma cama e uma esteira...

Nas ligas dessa fornalha,
As plagas se confundiram,
Vieram e se fundiram
Numa ponta de navalha,
Nessa dor bem mais canalha.
No medo da poesia,
Fiz a minha moradia,
Nos altos desse penedo,
Mas a chuva meteu medo,
Só restou melancolia...

Coronel Antonio Bento,
Cabra muito descarado,
Só matou pobre coitado,
Sempre a gosto e a contento,
Nem precisa juramento...
Pois mesmo de safadeza,
Carregado na pobreza,
Matou sem pedir licença.
Matou mais que a doença,
Por causa de miudeza.

Deu três tiros em criança,
Comeu ovo de valente,
Matou cabra já doente,
Se não me falta a lembrança,
Matou até esperança...
Sem dar chance de defesa,
Foi o rei da malvadeza,
Não perdoa nem defunto,
Quando a morte é o assunto,
Coronel é realeza...

Pois bem, meu companheiro,
Conto sem titubear,
Pela luz desse luar,
Juro pelo mundo inteiro,
Que no dois de fevereiro,
No sertão da Muriçoca,
Coronel virou paçoca,
Nas mãos desse matador,
Contratado por Doutor,
Lá da serra da Minhoca...

Doutor lá da medicina,
Homem muito conhecido,
Famoso por ser sabido,
Que conhecendo Marina,
Pelo amor, mal assistido,
Quis levar ela pro céu,
Nessa vida assim, ao léu,
Nos colos dessa montanha,
Conheceu a dor tamanha,
Na filha do Coronel...

De emboscada, na tocaia,
Foram três tiros com fé,
Dois na cabeça e um no pé,
Estribuchou qual lacraia,
Bem antes que o mundo caia,
Escapou por um milagre,
Mas a vida pro vinagre,
Ficou quase sem andar,
Agora deu de sonhar,
-Vou pescar aquele bagre...

Lá na capital mineira,
Escondido na grandeza
Da cidade, na certeza,
De que numa vez primeira,
Preparava uma rasteira,
Para o Coronel safado,
Mundo gira, tá girado,
Tempo passa sem parar,
Não perde por esperar,
Já tá tudo combinado...

Passa mês, passa dois, três,
Passa um ano sem notícia,
A vida naquela delícia,
Coronel matando rês,
Volta e meia, outro freguês.
Tudo em paz, na paz da morte,
Quem tiver pouco de sorte,
Escapa da covardia,
Vê nascer mais outro dia,
Sabe que é gado de corte...

Numa ponta de fuzil,
Na bala bem atirada,
Vida não valendo nada,
Coração batendo vil,
Nessas terras do Brasil.
A morte por encomenda,
A solidão vira tenda,
Vai cortando esse caminho,
Cabra andando tão sozinho,
É, da morte, compra ou venda...

Acontece que, Marina,
Moça bonita e safada,
Me pegou só, de empreitada,
Pela luz que me ilumina,
Foi a minha triste sina...
A moça bem sem vergonha,
Me deitou mesmo sem fronha,
Num travesseiro de terra,
Lá bem n’alto dessa serra,
Que prazer e dor medonha!

As pernas da moça prendiam,
Eram como um alicate,
Prontas para esse arremate,
Davam prazer e ardiam,
Depois, de novo, fugiam...
Madrugadas com Marina,
No mato, bem de surdina,
Dos grilos, de companhia,
Mordia, depois gemia,
Marina, doce menina...

Sabendo que essa querência
Era coisa do diabo,
Pisando em Satã, no rabo,
Imaginei qual valência
De morrer sem clemência...
Mas a vida tem seu jeito,
De fazer desse mal feito,
Uma nova circunstância,
Mesmo tendo na distância,
Essa dor que dói no peito...

Quis a vida, no seu bote,
Trazer minha solução,
Sem ter mesmo precisão,
De sangrar o seu cangote,
Nem viver desse rebote,
Tive a sanha mais querida,
De salvar a minha vida,
No meio desse pagode,
Matar esse velho bode,
Era a minha despedida.

Acontece que o doutor,
Sabendo da valentia
Que meu nome já dizia,
Entre os cabras de valor,
Escolheu, pra matador,
Dentre os homens do quartel,
Que sangrasse o Coronel,
Esse que aqui vos fala,
Me deu rifle, me deu bala,
Pra mandar ele pro céu...

Fiz que não queria tento,
Pois já conhecia a fama,
De deitar gente na lama,
De não ter um pensamento,
De saber que esse jumento,
Era a mais terrível fera,
Que riscava até cratera,
Nas pontas do cravinote,
Era preparar o bote
Que a morte sempre se gera.

Cobrei desse Satanás,
Pra fazer esse serviço,
Que eu mesmo já cobiço,
Quase vinte mil reais,
Se pedisse, dava mais...
Da raiva que ele mantinha,
Da tristeza que ele tinha,
De não poder mais andar,
Da querência de vingar,
As balas que ele retinha...

Numa noite sem ter lua,
Me preparei para a caça,
Com uns goles de cachaça,
Me dirigi para a rua,
Onde o medo não atua,
Onde a saudade não vinga,
Eu tomei mais uma pinga,
Prá coragem não fugir,
Na certeza de engrupir,
Os quatro ou cinco safados,
Que, pau desses bem mandados,
Dali não iam sair...

Acontece que, chegando,
Na casa do celerado,
Olhando assim, bem de lado,
Eu fui logo reparando,
Nesses olhos que, m’olhando,
Diziam pois sem dizer,
Que bem queriam me ter,
Da forma que sempre teve,
Na cama que me conteve,
Do jeito que fosse ser...

Marina, bem safadinha,
Camisola transparente,
Dizendo ser eu parente,
Do mesmo saco, farinha,
Me fez de galo, a galinha.
Colocou dentro de casa,
A fogueira e toda a brasa,
Que queriam tanto arder,
Era matar ou morrer,
A vingança não se atrasa...

Fiz da sorte, o sortilégio,
A vida foi na maçada,
Sangrou até na calçada,
A morte sei do colégio,
Matar foi meu privilégio.
Sei de tanta valentia,
Que não viu raiar o dia,
Sangrada no coração,
Não deixou sequer razão,
Nem a sorte que queria...

Wednesday, August 23, 2006

Seu moço, tanta saudade -Décimas

Seu moço, tanta saudade,
Foi feita de sofrimento.
Por um único momento,
Vasculhei realidade,
Passei por campo e cidade.
Procurei por meu amor,
Quero seu colo e calor.
Não encontrei nem indício,
Meu amor foi precipício,
Onde afoguei minha dor...

Meu tempo, disso estou certo,
Não teve nem mais valia,
Decerto que não sabia,
Não estava nem por perto...
Sei que viver é correto,
Mas de que vale sem ter,
Sem seu amor vou morrer,
Disso não tenho medo.
Seu amor foi o segredo
Mas que faço sem você?

Nas noites de solidão,
Que são as mais doloridas,
Me lembro das despedidas,
Vou pedindo seu perdão...
Me devolva o coração,
Sem ele, minha querida,
De que vale minha vida,
Nisso é melhor nem pensar,
Não tenho rumo ou lugar,
Não cicatriza a ferida...

Meus versos são bem tristonhos,
Por que ‘inda quero sonhar?
Sem você não há luar,
De que servem os meus sonhos...
Somente sonhos medonhos,
Povoam a madrugada,
Minha vida não é nada,
Sem ter você nada sou,
Minha estrada se acabou,
Cadê você, minha amada?

Nascido em terra distante,
Meu amor foi verdadeiro,
Da minha vida, o primeiro,
Que me deixou radiante.
Achei que eu era importante,
Em sua vida, meu bem.
Hoje sei que fui ninguém,
Nada fui para você,
Mas como posso viver,
A minha vida é um trem...

É tão triste a sina, agora,
A de não ter a mulher,
Que o peito da gente quer,
Por quem a gente só chora.
Saudade vem, me devora,
Engole meu coração,
Vomitando solidão,
Saudade bicha danada,
Acompanhou minha estrada,
Não quer me deixar mais não...

Procurei pelos seus braços,
Por sua boca divina,
Fiz minha alma cristalina,
E nem quis outros abraços,
De você nem vi os traços...
Perdida por outra banda,
Por onde é que você anda,
Me responde, eu lhe peço,
Senão, lhe juro, tropeço,
Nas danças dessa ciranda...

Meu amor trago meu canto,
Nas décimas que lhe faço,
Mas já perdi meu compasso.
Naufragado em seu encanto;
Restando só o meu pranto,
Não consigo meu intento,
Minha voz, perdida ao vento,
Você nunca vai ouvir,
Desde o dia que perdi,
Só conheci sofrimento...

Quem souber dessa morena,
E cujo nome é Ritinha,
Não é alta, é bem baixinha,
Tem uma boca pequena.
É calma, muito serena.
É bem fácil de encontrar,
É só olhar pro luar,
E reparar na beleza,
Assim, com toda certeza,
Fica mais fácil de achar...

Ela não anda, flutua,
A fala dela é de fada,
Por todos é adorada,
Ilumina toda a rua.
Minha vida é toda sua...
Tem os pés mais delicados,
São, por Deus, abençoados.
São provas que Deus amou,
Tudo que dela restou,
No meio dos meus guardados,


São essas fotografias,
Que mostro para vocês,
Repare bem nessa tez...
São repletas de magias,
Obra prima que Deus fez...
Moço, me diga a verdade,
Por minha felicidade,
Me responde, bem ligeiro
Se já viu, no mundo inteiro,
Me diga, por caridade,

Onde encontra essa tal moça,
Em que país ou Estado?
Coração descompassado,
Chorando, pede que ouça,
Meu lamento desgraçado
Já não chora outro chorar,
Não canso de procurar
Quero encontrar a Ritinha
Que num dia já foi minha,
E que não sei onde está...

Caminhão vai cruzando essas estradas Sextilha

Caminhão vai cruzando essas estradas,
Norte-sul, sem temer as curvas, segue.
Nas descidas, banguela. Nas lombadas,
Nada impede que suba e que carregue,
Um país, nessas tantas toneladas...
Percorrendo os caminhos de mãos dadas,

O progresso e futuro, são seus passos...
Vagando, sem temer má sorte e sina,
Caminha, faz das retas, seus espaços,
Muitas vezes, audaz, nem mesmo atina
No valor que se insere nos seus braços...
O caminhoneiro esquece seus cansaços...

Saudade...

Guinada da saudade, faz doer...
Não quero nem saber de ter saudade.
Saudade muitas vezes, faz morrer,
Saudade faz estrago, de verdade...

A saudade traduz verbo sofrer,
Conheci tal saudade, tenra idade...
Tenho tanta saudade de você,
Saudade dos teus olhos, claridade...

No que saudade mata, sei de cor.
As luas da saudade me torturam,
Saudade dess’amor, que é o maior.

Os males da saudade só se curam;
Onde a saudade vive bem melhor,
Nos braços que, saudade, mais procuram.

Quero ser aprendiz de feiticeiro

Quero ser aprendiz de feiticeiro,
Fazer meus versos simples sem buril.
Cantar amor, meu sonho brasileiro,
No meio da poeira, pueril...

Quero aprender da vida, por inteiro,
O que, bem antes, fora mais gentil.
Travar batalhas, tantas, com tinteiro;
Tentar pintar, com cores, meu Brasil...

Minhas mãos calejadas não se calam,
Procuro em formas límpidas, meu sal.
Essas palavras soltas tanto entalam,

Que se não as escrevo, fazem mal.
Os perfumes qu’as almas sempre exalam,
Carrego bem comigo, no bornal...

Balançado o coqueiro, peço a Deus

Balançado o coqueiro, peço a Deus,
Que me dê um pouquinho de alegria.
Quem me dera não fossem tão ateus,
Os dias que perdi por ti, Maria...

Sertanejo, decerto, sabe os breus,
E conhece, também, manhas do dia...
De Julietas sabe, e dos Romeus,
Esperando calar a cotovia!

Na tristeza dos versos, por paixão,
Decerto viverei minha esperança.
Extraída de tanta distração,

Esperança bandeia da lembrança.
Restando tão somente o coração,
Vivaz como brinquedos de criança...

Por que não sei falar dessa maneira Oitavas camonianas

Por que não sei falar dessa maneira,
Usando os verbos vagos, virulentos,
É que perdi meu tempo, uma bandeira,
Desfraldada por sobre os excrementos
De quem tentou ferir sobremaneira
A quem amara, em todos os momentos.
A vida me ensinando não temer,
Eu vou correndo sempre, mas por quê?

Quis tragar melodias e senzalas,
Não pude mais conter esse chicote.
Mas as costas lanhadas onde exalas,
Não me deixam sinal, quebrei o pote...
Traduzindo seara, levo malas
Em busca da saída, vou a trote.
Mas queria viver teus novos dias,
Nas nocivas franquezas que medias...

Num ato de belíssima vontade,
Misturando, sagaz, novas cantigas.
No que não poderemos crer saudade,
Eram senão pedradas mais antigas.
Coram, cegam, feroz realidade.
Queimando como fosses tais urtigas,
As que n’alma repetem cantinelas,
As mesmas que quisemos, serem delas...

No meu karma sei pétrea solidão,
Onde navegaria tantos portos.
No dizer sim, queria tanto o não,
Carregando por certo, velhos mortos.
Na melhor melodia que verão,
Perderei tantos rumos, que sei tortos.
Minha lança, lanceta e confraria,
Nos bares e botecos; dê sangria...

Capuccino, cachaça, chá e mate,
Novos sabores, fluidos paladares;
Da vida sempre torta, um arremate.
Nos teus olhos repletos dos altares,
Brilham loucos fantasmas do combate...
Revejo minha triste lucidez
Quem me dera perder a minha vez...

Pus e sangue, mistura delicada,
Que, emanando de todos os meus dedos;
Fazem-me saber, como está errada
A vida que criei de meus segredos.
Quando permiti noite, madrugada,
Deixei armazenados os meus medos...
Num quero nem concebo liberdade,
Vagando pelos parques da cidade...

Nascido nessas terras das Gerais,
No que pude sentir, foi tudo a esmo.
Não temo nem tempestas, vendavais,
Criado, de cedinho, com torresmo.
Em meio a cercanias sem jornais,
Aos olhos dessa noite, sou o mesmo...
De pequeno, nutrido com coragem,
Desse rio, conheço fundo e margem...

Fui ninado com sangue e com melaço,
Rasguei no mundo berro e valentia.
Peito duro, mineiro, ferro e aço,
Criado a tapa, restos, serventia...
Força nos olhos, pernas e no laço,
Por onde acordei, vida sem valia.
Traquinagem, comer sem saber faca,
Beber da fonte, tetas dessa vaca...

Orgasmos madrugada, tua saia...
No canto, no curral, em pleno mato,
Nem sei de mar, vivendo minha praia
Na beira doce, peixes no regato...
Em plena confusão, rabo d’arraia,
Na morte fiz carinho, sei dar trato...
Quebrando minha perna, sem ter pena,
De longe, traz as pernas da morena...

Vadio violão foi meu resgate,
No colo dessa serra, serenata...
Saudade faz que mata, dá empate,
Menina, levantei a tua bata...
Preciso, cafuné, qu’alguém me trate,
Eu quero te lavar nessa cascata.
Jogando nessas pedras da ribeira,
Teu corpo, penetrando-te, mineira...

Costeleta da Serra D´Espinhaço,
Fiz cabelo, bigode e barba, tudo...
Eu quero me deitar no teu cansaço,
Guardando meu diploma, meu canudo,
Em meio a tuas pernas, teu regaço...
Entrando mais calado, saio mudo.
Talvez me guardes todos os mistérios,
Nem temo teus amores, nem venéreos...

Cresci sofrendo tapa e pescoção,
Na lida atroz, enxada e cavadeira.
Nos brejos, sem temer por podridão,
A vida foi completa escarradeira.
Vacina de menino, de peão,
É feita de porrada, a vida inteira...
Das vespas que mordiam, fiz meu mel,
Da lida mais difícil trouxe céu...

Meu medo foi ter medo de lutar,
Não quis compressa, quero bisturi.
Cada ferida nova que brotar,
Capítulo relido que vivi...
Somente meus, serão; velho luar,
Os olhos dess’amor que já perdi...
Capricho sem temer, por resultado,
Os cortes que sangrei, apaixonado...

Recebendo a herança mais maldita,
O traste que pariu minha cadeia;
Não queira meu Senhor, que se repita,
A bosta que transcorre em minha veia...
Minha mãe, talvez, fosse mais bonita,
Se não tivesse sido uma sereia...
Que o boto mais pilantra desse mundo,
Safado caboclim, um verme imundo...

Criado sem ter beira nem paragem,
Escravo desd’o dia de nascido.
A vida preparou a sacanagem,
Bem no olho dessa serra, fui cuspido.
Quase que me perdi na traquinagem,
Mas, embora isso tudo, fui crescido...
Vômito de mendigo esfomeado,
Coragem coração, fez cadeado...

Meu cigarro da palha mais curtida,
No milharal da vida, colhi nada.
Serei por certo, servo e despedida
Nunca saberei sorte e tabuada,
Mas não reclamo nada dessa vida,
Estou vivo, e se dane essa embolada.
Na poeira joguei nome e meu futuro,
A morte me espreitando ‘trás do muro...

Fiz cósca em cascavel, minha tapera,
Tem as portas abertas para a morte.
Não temo solidão, nem bicho fera;
Eu queimo, em toda curva, a minha sorte.
Cachaça com limão, vida tempera,
Bem no meu coração, de grande porte,
Cravei as verdadeiras, duras, garras.
Não quero mais saber dessas amarras...

Veloz, eu fugirei dessa saudade,
A saudade de nunca mais ter sido.
A saudade feroz, felicidade,
Que nunca mais terei, nem conhecido.
Oprime o peito, face essa verdade,
A de não ter, jamais, nem ser nascido...
Queria, por momento simplesmente,
Um segundo sequer, me sentir gente...

Vieste como tábua; salvação...

Vieste como tábua; salvação...
Acreditei que; enfim, tinha encontrado,
A porta da saída, a solução.
Porém, vida mordaz, deu seu recado:

Em poucos dias, foste um outro não.
Perdido, sem saber para que lado
Poderia encontrar outro portão,
Bato de porta em porta, des’perado...

Vieste, muito cedo, me deixaste.
Agonizei na nova despedida.
Dos meus olhos,vou cego, tu levaste

Toda luz que guiava minha vida...
Perambulo, sem rumo, sou tal haste
Que nunca mais terá prumo, perdida...

Tuesday, August 22, 2006

Perguntas; vento leva para além...

Perguntas; vento leva para além...
Respostas nunca chegam por correio.
Saber se quis gostar, se fui alguém,
Se houve tempestades ou recreio...

Muitas dessas premissas caem bem,
Entretanto,outras tantas, nunca ateio.
Somente vasculhando sei que; sem
Muitas delongas, erguem os teus seios...


As respostas do vento, ou do mar,
São todas intrigantes, verdadeiras.
Netuno bem sabia navegar,

Zéfiro ao soprar, límpidas traineiras,
Velocidade injeta, sem parar.
As respostas virão, dessas maneiras...

Sextilha com estrambote - As portas do que fomos entreabertas

As portas do que fomos entreabertas,
Deixando tão somente uma certeza;
Quem dera se depois de descobertas,
Nossas farsas pudessem dar grandeza
Ao caminho que, temos que encontrar,
Nem que seja, somente para andar...
Sem nunca chegar!

A véspera da fome é o degredo

A véspera da fome é o degredo;
Por isso não segregue o coração.
Segredes o mais límpido segredo,
Mas nunca me permita a solidão...

Da vida já nem quero novo enredo,
Me basta ser feliz; que vou fazer?
Não quero temerário nem ter medo,
Só quero, simplesmente teu querer...

Espero nova espera mais feliz,
Num tempo que se torne mais amigo;
Anseio por teus seios, meretriz.

No mérito que tomas por perigo,
Artigo que me trouxe: flor de lis.
Tateias teus tentáculos, nem ligo...

Ah! Quem me dera fosses meu amor!

Ah! Quem me dera fosses meu amor!
Como a vida seria mais completa.
A poesia, amiga predileta,
Companheira, por onde quer que eu for;

Teria enfim, parceira mais dileta.
E nunca mais seria um sofredor,
Quem sempre teve espinhos nunca flor,
No sonho audaz, tentando ser poeta...

Se fosses meu amor, que bela a vida!
Andar buscando glória, sorridente.
Não conceber sequer a despedida...

Sentir o teu perfume que, envolvente,
Penetra nas narinas. Na sofrida
Luta por viver; sentir-me gente!

Pomba rola voando vai distante

Pomba rola voando vai distante,
Escapando, veloz, da atiradeira.
Por esse tempo todo, galopante,
Meu coração fugindo, vida inteira...

Nas cordas do meu pinho, delirante,
Procuro te encantar; és a primeira
Que me tomou as rédeas, dominante...
Quem dera se dormisse em minha beira!

Traços livres, desenho teu retrato.
Resenho nossos livros sem prefácio.
Estilos contrapostos; insensato,

Difícil entender se fosse fácil.
Mas quero m’afogar no teu regato,
Quero morrer d’amor no meu Estácio...

Poeta, disse Pessoa Trova

Poeta, disse Pessoa,
É um cabra fingidor.
Vou fingindo que ela é boa,
Ela diz que eu também sou...

Patroa, tome cuidado,
Não bote essa minissaia.
Se cometer o pecado,
A senhora toma vaia...

Não bote culpa na idade,
O seu tomara que caia;
Por ação da gravidade,
Tá batendo lá na saia...

O vento é bom companheiro,
Não deu outra, ele não “faia”,
Tá ventando no terreiro,
Como é bonita essa saia...

Pinguço não toma cana,
Sacana não bebe pinga.
Se embananou, dê “banana”,
Mas, se fedeu, não me xinga...

Maricota fez melado Trovas

Maricota fez melado,
Joaquim foi lá provar.
Desse mel saiu molhado,
Agora não quer casar!

Bateu trem com um fusquinha,
Pouquinha coisa restou.
Maria, Mariazinha...
A outra metade ficou.

Levei água na peneira,
Com ela tampei o sol.
Namorei a noite inteira;
O marido? Futebol...

Moço tome cuidado,
O telhado é bem miúdo.
Pode ficar agarrado,
Ou furar com telha e tudo...

Da licença d’eu contar,
O que foi que sucedeu...
Pescaria no luar,
Até piranha rendeu...

Fiz um bote de cortiça,
Pr’ele melhor flutuar.
Vê se pára de cobiça,
Sereia não vou pescar...

Nesse vaso sanitário Trovas

Nesse vaso sanitário,
Me lembrei bem de você.
Flutuando fica hilário,
Não consigo lhe esquecer...

Toda vez que penso em ti,
Lá vem a dor de barriga.
Um danado piriri,
O resto, bem, é lombriga...

Minha sorte tá lançada,
Nos dados da solidão.
Amor é carta marcada,
Sempre sofre o coração...

Jogatina, Tina joga,
Joga tanto sem parar...
Na tina que Tina roga,
Nunca praga de rogar...


Na manhã do meu amor,
Entardece essa beleza.
Anoiteço em teu calor,
Vou vivendo realeza...

Nascido joão de barro Trovas

Nascido joão de barro,
Fiz uma casinha pr’ela;
A danada tirou sarro,
Tranquei até a janela.

Solução pra casamento,
Quando o troço dá quebrante;
Dar três fora e uma “dento”,
É melhor ter uma amante...

Jornal velho e repetido,
Não serve mais para nada.
É melhor não dar ouvido,
Ou troco de namorada...

Fabriquei uma viola,
Fiz dois traços, distração.
Passarinho na gaiola,
Não sabe cantar mais não...

Jogo de carta marcada,
É tremenda sacanagem.
Não vou dar essa mancada,
Casamento é só bobagem...

Jesus Cristo, nesse mundo Trova

Jesus Cristo, nesse mundo,
Era um simples carpinteiro.
Agora tem vagabundo,
Querendo ganhar dinheiro...

Se vaso ruim não quebra Trovas

Se vaso ruim não quebra,
Andorinha faz verão...
Quando você se requebra,
Estraçalha o coração...

Menina fez um remendo,
Nessa colcha de retalhos;
Tô com sede, vou comento,
Alhos junto com bugalhos...

Minha casa é de sopapo,
Meu amor de pescoção.
Galinho que é bom de papo,
Ensopado com feijão...

Minhoca metida a cobra,
Vira logo minhocão.
O que tem muito não sobra,
O que falta, é solução...

Vara de pescar quebrada,
Também pega lambari.
Eu quero você pelada,
Seja lá ou seja aqui...

Quem não cola faz escola,
Quem colou e se deu bem;
‘Tô passando essa sacola,
Boto dez e tiro cem...

Vigarice do Dodô,
Deu-se bem e caiu fora.
Procuro por meu amor,
Ele também foi embora...

Trova

Na lanterna desse olhar,
Refletiu todo meu céu;
Do meu amor, quero o mar,
Tenho aveia, quero o mel...

Memória, crudelíssimo carrasco

Memória, crudelíssimo carrasco,
Termômetro de quantos vendavais...
História, vai girando seu fiasco,
Num tom sobre tom, marca, contrafaz...

Colibri, pirilampo, país basco,
Sonoridades sépias, nunca mais...
No paralelepípedo, meu casco.
E, vergonhosamente, tudo trais...

Beija-me muito, quero contra-sensos,
Acender aos celestes magazines...
Meus sábados, domingos são imensos...

Na praça, atenção: todos esses cines,
Passarão mesmo filme, são pretensos...
Não há tino, nem cetro, desatines...

Vinil

Só, jogado, esquecido nesse canto,
Deixado ao pó, segundo plano atroz...
Quem, outrora, movera tanto encanto,
Relegado deixado sem ter voz...

Noutros dias, causara tanto pranto,
Atando e desatando laços, nós...
Hoje, quem te viu, sabe o desencanto
Que trago ao perceber-te, sem seus dós...

Namoros começaram, terminaram...
Embalavas amor, manso e servil.
Os nossos sentimentos afloraram,

No suave rodar bem mais gentil,
Que tristeza profunda nos qu’amaram,
Ouvindo teus cantares, meu vinil...

O Piolho

Um piolho vagueia sem ter pressa,
Na cabeça, coçando sem parar...
Passeio de piolho coça à beça.
Não consigo parar de me coçar!

Ó bichinho danado sai depressa...
Não quero e nem pretendo te aguentar!
Parece que prazer te dá, or’essa!
O quê que irei fazer pra me livrar?

De noite, então, martírio fica feio...
A caspa, companheira xexelenta,
Com ele faz dueto e eu no meio...

Já passei, na cabeça, até pimenta,
Não adianta, logo que bobeio,
Recomeça a coçar, a piolhenta!

Oitavas camonianas - Dorian Gray

Bares e bordéis, bordas sem aparas,
Em meus dedos, falanges e fraturas.
Tento tragar tentáculos e taras.
Nas mãos cansadas, noites escuras...
Vadeio vagamente, envergo varas
Iscadas em tais margens. Armaduras
São as minhas defesas, indefeso.
Crustáceo ameaçado no defeso...

Fracassei, quis demais, nada resume.
Não quero saber sempre, nem talvez.
Restou um gesto amargo; vou, estrume,
Onde pensara um dia, na altivez.
Procuro mansidão por onde aprume,
As mais diversas formas, tanto fez...
Não virgulo, decifro ângulos retos,
Por mais que se queira, são incompletos...

Vendi alma, nos verdes campos postos...
São clamores senis, são veros vagos,
Nervos e dentes, quebro-os. Impostos
Colocados sobre velhos estragos,
Não trazem nem sequer tosto-os;
Meus medos nadarão nos outros lagos.
Por certo, caridade nem demérito,
Demovem quem sonhou seu próprio féretro...

Nasci do mais decrépito dos medos,
Busquei nas madrugadas, meu sustento.
Não fui completo, simples arremedos,
De quem tentara tanto fosse tento...
Enganos, meus engodos, sempre ledos,
Palavras vão mais soltas, neste vento..
Sangrei cada momento sem desculpas,
Procuro por amores, tenho lupas...

Cimitarras; usei nestas batalhas,
Conta qualquer que fosse esse inimigo.
Vivendo, sobre lâminas-navalhas,
Carrego os meus delírios cá comigo...
Quando estou decidido; tudo talhas,
Entalhados na brasa do perigo...
Não quero nem machados e nem sândalo,
Amores me fizeram, enfim, vândalo...

Cusparadas no rosto são promessas,
Hemorragias, vertem no meu ventre,
E vens, tão calmamente, com compressas.
Dane-se, nada quero que m’adentre...
Se são meros deslizes, são conversas.
Meus portais são marcados por: Não entre!
Não quero e nem permito que me ceifes.
O que me trazes cabe nos esquifes...

Víbora e cascavel, conheço bem...
Não trazes outra marca bem o sei.
No breu das velhas tocas, sem ninguém,
Conheço teu passado e tua lei.
Fingindo caridade, cadê? Sem...
Nas tuas ladainhas me acabei.
Prato escarrado, cuspo em quem cuspiu.
Mordaz, irei mordendo. Me esculpiu...

Retrato a realidade em que me deixas,
No basta, bastaria meus embates,
Não quero nem saber de tuas queixas,
Nem quero mais ouvir tais disparates.
Me finges ser esfinges, talvez gueixas.
Prometes novo canto, mas combates
Quem poderia, límpido, caber.
Me deixas; assim, lívido, porque?

Me enojo quando beijo tua boca,
O gosto podre emana quando ris.
Te fazes de sutil, mas te sei louca,
Não queres e nem deixas ser feliz.
Vomitas impropérios, és tão pouca,
Muito menos que pensas; nenhum triz.
Recebo o sopetão que não assusta,
És maquinal vergonha, mas vetusta...

Sofrível sentimento são teus gestos,
Na verdade, pareces bem comigo.
De malícias, delícias, já infestos.
Por isso reconheço tal perigo,
Nós dois, juntos, daremos aos incestos,
Um novo paladar e qualidade,
Seríamos espelhos, na verdade...

Você, minha cachaça predileta

Você, minha cachaça predileta,
Embriagado sigo; sem ressaca...
Minha comida, mesa mais repleta,
Banquete, minha fome nunca aplaca...

Quem me dera pudesse ser poeta,
Escrever tantas coisas numa placa,
E dizer poesia, mais dileta.
Poder gritar seu nome, maritaca,

Avisando aos passantes dessa mata,
Que meu amor me cura e me maltrata...
Poder me recordar de cada beijo,

Você, o meu maior, grande, desejo...
Nesses seus olhos tristes, azulejo...
Uma armadilha; cuida, mas maltrata...

Nossa luta, buscando liberdade

Nossa luta, buscando liberdade,
Tantas vezes depara com vergonhas.
Muitas vezes, no campo e na cidade,
As desilusões surgem, são medonhas...

Quem dera se pudesse ser verdade,
O mundo bem melhor que tanto sonhas...
Um dia, talvez, nunca será tarde...
Poderá ser possível ver risonhas

As mesmas faces, hoje tão sofridas...
Sonhar um impossível sonho, crer!
Combustível maior de nossas vidas.

Juntos, todos, quem sabe eu e você,
Iremos dormir, camas repartidas,
Mas um só sonho, belo de viver!

Soneto com estrambote - Pinguim

Vem andando de fraque, tão solene,
Com passos chaplianos, faz sucesso.
Eu bem sei que, nadando, teu progresso
É maior. Faz que o corpo todo empene,

Por meio dessas asas que, confesso,
Surpreendem. Sugere que m’acene
Quando sei, na verdade se te peço,
Dirás nada, por certo, tutto bene...

Vez em quando, resolves passear.
Umas férias mereces, estou certo.
Mas teimoso, nadando sem parar,

Tu não queres ficar aí, nem perto.
Nas praias cariocas, tanto mar...
Que fazer? Viajar no mar aberto..

Cansado então, do passeio,
Vens bater na minha praia,
És teimoso sim, bem creio
Que tu queres é gandaia...
Não tem outro jeito não...
Na volta, vais d’avião...

Meu canto é socialista, sim senhor.

Meu canto é socialista, sim senhor.
Não quero mais injustas possessões.
Quero o orgulho, poder viver amor,
Sem temer por quaisquer desilusões.

Somos iguais, dizia Nosso Senhor,
Tocando fundo em nossos corações...
Mas o homem, cruel em seu valor,
Traduziu os pecados em perdões...

Sou feliz, tenho tudo que sonhei,
Tenho nos olhos, brilho mais vontade.
Meu reino interior, nele sou rei...

Quero compartilhar felicidade,
Eu assumo, entretanto, o quanto errei...
Nos olhos dos meus filhos, a claridade!

Tanta carnificina, tanta dor...

Tanta carnificina, tanta dor...
Por que ninguém atina para a paz?
Qual motivo, é tão justo, qual valor
Que mereça; me diga se é capaz!

Em qual Deus se baseia o matador?
Dilacerar crianças, satisfaz?
Tanta tortura, tanto desamor.
Qual a liberdade podridão traz?

Uma só raça, somos “sapiens”, homo.
Sapiens: desfigurada tradução...
Me pergunto o porque e, bem mais, como?

A terra dividida: É nosso o chão.
A cada novo crime, tudo somo,
Está em nós, somente, a solução!

Soneto com estrambote - Toda delicadeza do perfume

Toda delicadeza do perfume
Que tua alma divina exala, amada,
Me remete aos jardins do Éden, lume
Das estrelas; clareia minha estrada...

Saborear magnífico de cada
Banquete que ofereces, num costume
Celestial, que tanto atrai, agrada
Ao paladar, aos olhos... Vaga-lume...

A minha fantasia transformada
Na mais bela mulher que Deus criou,
Mais fina porcelana, comtemplada

Por mãos mais delicadas; hoje sou
Tão somente um vazio, quase nada,
Sem ter-te, muito pouco me restou...

Te procuro, então, no sonho,
Nada tenho, nem o chão...
Me persegue, tão medonho,
Fantasma da solidão...

A Tesoura

Quando vestes tão bela vestimenta,
Esqueces da tesoura, que a cortou.
Num vai e volta tira, experimenta,
Acertando, solene, o que sobrou.

Outras vezes, cabelos ‘té da venta,
Vais cortando, deixando o que sobrou.
Quando, enfim o Brasil tornou-se penta,
Seu trabalho ajudou, ‘té fazer gol...

És, portanto, fiel a quem te trata
Com carinho e com arte verdadeira.
Mas, se quem usa abusa e te maltrata,

Tu completas sem pena tal besteira...
Mas, uma coisa falo, és bem ingrata:
Só por não podar língua fofoqueira...

O sapato

Quando vou caminhando pelas ruas,
Muitas vezes me sinto machucado.
As pedras do caminho, quando nuas,
Adentram sem querer, o meu calçado...

Quantas vezes, sofri, dores mais cruas,
Só por culpa de estares apertado.
Com um calo brotando, nem zil luas,
Poderei me inspirar, pobre coitado...

Quando vejo mulheres, tão bonitas,
Calçando um improvável bico fino;
Ao bom Deus, pergunto: como acreditas;

Ser possível tamanho desatino,
Espremendo assim demais, arrebitas
Os cinco pobres dedos, num só pino...

Uirapuru cantou, lembrei de ti.

Uirapuru cantou, lembrei de ti.
Meus olhos são problemas sem remédio.
Chorar não mais, irei longe daqui,
Trocar o sofrimento pelo tédio...

Rimei tantas palavras, me perdi.
Se cada movimento nesse prédio,
Me lembra solidão que não vivi,
Sendo franco, prefiro mais que assédio...

Não gosto do tumulto dessa rua,
Nem quero esse calor feito emboscada.
Eu te desejaria, toda nua,

Depois, que se danasse, quero nada...
Eu fecho a persiana, tapo a lua.
Não quero nem manhã nem madrugada...

No vértice da vida, capotei,

No vértice da vida, capotei,
A queda transformou-se num dilema;
Quem dera, nessa vida fosse rei.
Talvez não conhecesse mais problema...

Por certo; mil desejos sufoquei,
Não há, pois, quem a queda nunca tema,
Nem há quem não me diga que eu errei.
Mas, em cada tropeço, novo lema.

Em cada queda, vivo outra saída,
Lições aprendo, troco de estratégia.
Qual solução? Qualquer que eu elege-a,

Talvez não seja a certa, a preferida.
Vivendo por viver, toda essa vida,
De todas as vitórias, nunca a régia...

Melancolia bate em minha porta

Melancolia bate em minha porta,
Solidão disfarçada em poesia.
Apenas um retrato me transporta,
Para a lembrança amada de Maria...

Bem sei que nada disso mais, importa;
Procuro por teu colo na cercania,
Mas cada vez que tento vejo, morta,
Já qualquer esperança d’outro dia...

Melancolia bate e nem respondo,
Mais quieto, adormecido, me reservo.
Amanhã; renascer, me recompondo,

Em várias fantasias, me conservo.
Meu mundo circulando vai, redondo,
No fim da noite, disso tudo, servo...

Monday, August 21, 2006

Nasci na batucada dessa vida

Nasci na batucada dessa vida,
Em pleno carnaval, sem esperanças.
A marca dum cigarro foi tingida,
A primeira e mais forte das lembranças...

Minha mãe, colombina noutra lida,
Fazia cada noite mais crianças.
Suas pernas abertas, foi tangida
Feito gado, nas danças, contradanças...

A velha prostituta enfim morreu,
Tuberculose escarra podridão.
Desses dez que pariu, sobreviveu

Um só moleque, feito solidão,
Minha sorte vadia, feito meu.
É que inda vou cuspir nesse teu chão.

Bêbado da saudade de Maria

Bêbado da saudade de Maria,
Vou fechando boteco após boteco.
Noite raia, clareia novo dia,
Os meus passos trocando, paro, breco.

Saberei do conhaque, tanta orgia,
Meus suores e lágrimas, eu seco.
Eu confundo verdade e fantasia,
Nem deu tempo: saí com meu jaleco.

O meu nome estampado, qual crachá,
Denuncia que estou de sobreaviso.
Dane-se, quem irá se preocupar?

Pelas escadas, caio, vou, deslizo;
Pior, essa cachaça é d’amargar!
Morrer agora é tudo que eu preciso!

Minha alegria é faca, corta fundo

Minha alegria é faca, corta fundo.
Dilacera qualquer que tenha medo.
Vagueando, penetra todo o mundo,
Na ponta dessa faca, meu segredo.

Nas marés cheias, enche tudo, inundo...
Faca foi amolada, no degredo.
Temperada a coragem, vagabundo,
Nas tardias da vida, cortou cedo.

Faca vadia, trava guerra à toa.
Embarca na arapuca preparada
Por essas mãos, as mesmas, que canoa

Fizeram virar, tomba marejada.
Inda por cima, fala: faca boa!
Minha alegria, faca enferrujada...

Tercetos - Eu não te quero, apenas te desejo

Eu não te quero, apenas te desejo,
Na minha solidão, guardo teu beijo.
Um retrato deixado na parede...

Tantas vezes sonhei, mas nem recordo,
Apenas navegar, contigo a bordo.
A garrafa demonstra minha sede...

Eu já não mais anseio, nem quero ter,
Tanto me faz ganhar ou te perder.
Quem sabe, poderei me libertar.

Cada momento segue sem depois,
Não quero mais teus beijos, um ou dois.
Talvez Deus permitisse, enfim sonhar...

Trovas - A Minha Amada

Um canto na madrugada,
Traz um gosto de tristeza...
Saudade da minha amada,
Levito nessa beleza...

Silencio sobre tudo,
Não quero falar mais nada...
Vou calado, sigo mudo,
Esperando minha amada...

Não sei falar mais de dor,
Caminho sempre n’estrada,
Estrada do meu amor,
Estrada da minha amada...

Na curva dessa saudade,
Capotei, curva danada...
Vou viver felicidade,
Nas curvas da minha amada...

Trago meu peito cansado,
Minha mão, no peito, atada...
Peito bate des’perado,
Saudades da minha amada...

Menina quero teu colo,
Deixa de ser tão levada;
Vou te deitar neste solo,
Te fazer a minha amada...

Eu nem sei de valentia,
Nem quero cair da escada;
Seja noite ou seja dia,
Eu só quero minha amada...

Vergalhão cortou bem fundo,
Sangria desesperada;
Quer dor maior nesse mundo?
Distância de minha amada...

Vento ventou no telhado,
Chuva caiu na calçada.
Triste sina, triste fado,
Procuro por minha amada...

Toda fumaça que eu trago,
Vai subindo espiralada.
No pulmão faz tanto estrago,
Volta pra mim, minha amada!

Não quero nem mais viver,
Vida vai descontrolada.
Procurando, por você,
Sem encontrar; minha amada...

Quero poder noutro dia,
Estar co’alma lavada.
Oh! Meu Deus, como eu queria,
Saber de ti, minha amada!

Tanta maldade na terra,
Voa então, minha alma alada,
Sobe morro, desce serra,
Procurando a minha amada...

Lavei meus olhos tristonhos,
Na poça d’água parada.
Vou sonhar todos os sonhos,
Até sonhar minha amada...

Amor me pegou de banda,
Escondido, de empreitada;
Lua daqui, de Luanda,
Traz para mim, minha amada...

A moça bonita dança.
Moça da saia rodada;
Coração traz esperança,
Da dança da minha amada...

Pedra faz onda no rio,
Depois de ter sido lançada;
Vou vivendo o desafio
De ondear minha amada...

A safira dest’anel,
Aonde foi encontrada?
Olhei pra terra e pro céu,
Encontrei a minha amada...

Diamante traz riqueza,
Jóia muito procurada;
Mas muito maior beleza,
Nos olhos da minha amada...

No sertão cantando primas,
Tem viola enluarada;
Encontrei todas as rimas,
Nos lábios da minha amada...

O que presta nessa vida,
Nunca foi coisa comprada;
Minha alegria perdida,
Encontrei na minha amada...

Tanta verdura gostosa,
Delas fiz uma salada.
Vida vai maravilhosa,
Nos beijos da minha amada...

Serpenteia minha sorte,
A vida é carta marcada.
Jogo pesado, de porte,
Aposto na minha amada...

Vaso duro não se quebra,
Nem fica a casca arranhada;
Tão lindas, quando requebra,
As ancas da minha amada...

É de Deus a escolhida,
Foi, por ele, abençoada.
Nunca mais quero outra vida,
Nos seios da minha amada...

Canto cantiga de roda,
Samba, bolero e toada.
Planta crescendo na poda,
Quero colher minha amada...

Cantor que canta forró,
Canta xote e embolada;
Nada no mundo é melhor,
Que os braços da minha amada...

Quando cheguei lá de Minas,
“Truce” queijo e até coalhada.
“Truce” coisas tão divinas,
Só num “truce” minha amada...

Da chuva eu sou só um pingo,
Mas você quer trovoada.
Quando choro, esse respingo,
Vai molhar a minha amada...

Toda essa reza que eu rezo,
Na Igreja ou na orada.
Tudo que eu deveras prezo,
Encontro na minha amada...

Na vida perdi o freio,
Capotei numa guinada.
A vida me pôs arreio,
Nas pernas da minha amada...

No circo triste da vida,
Eu perdi a minha entrada.
Só encontrei despedida,
Só me restou minha amada...

Eu sofri tanto, bem sei,
A vida me deu esporada.
Aqui, ao menos sou rei,
No reino da minha amada...

Chora cavaco chorão,
A noite vai embalada.
Vai chorando o coração,
Lágrimas de minha amada...

Dançando xote e baião,
Danço até uma lambada.
Só não danço solidão,
Peço perdão, minha amada...

Errei demais, eu sei bem,
Minha vida é toda errada.
Sem você não sou ninguém,
Me desculpe, minha amada...

Feira boa é a que tem,
Muita coisa variada.
Só não encontro meu bem,
Onde estás, ó minha amada?

Te procurei num castelo,
E não passei da fachada.
Todo dia, então, eu velo,
Na busca da minha amada...

Eu tentei cantar um hino,
Vitrola tá enguiçada.
Quem me dera ser menino,
Para cantar minha amada...

Com varinha de condão,
Eu encontrei minha fada.
Só me restou ilusão,
Encantar a minha amada...

Trabalhei por tanto tempo,
Cavoucando com enxada.
Mas foi tanto contratempo,
Onde “plantei” minha amada?

Já tive tanto revés,
Eta vidinha azarada!
Lavei navio e convés,
O mar levou minha amada...

Mulher ficando nervosa,
Entra muda e sai calada.
Mas feliz, fica bem prosa,
Fala pra mim, minha amada...

Lá na casa que eu morava,
Dizem que é mal assombrada.
Mas era eu quem chorava,
Só por você minha amada...

De tanto amor nessa vida,
Eu a levo endividada.
Vou fazer a despedida,
Já cansei da minha amada!

Meu amor aqui tão só Trovas

Meu amor aqui tão só,
Espero por teu carinho;
Canta triste curió,
Tenta fazer o seu ninho...

No cantar duma graúna,
Encontrei meu bem querer;
É forte como braúna,
O meu amor é você!

Na viola canto primas,
Minhas primas, vou cantar;
Vou brincando com as rimas,
‘Té o tio reclamar!

Sei o gosto da tristeza,
Agostos quase setembro;
Maria foi a beleza,
Que eu encontrei em dezembro...

As marcas do meu passado,
Ficaram no que vivi;
Meu amor foi encontrado,
Jogado no CTI...

Amor que me traz saudade;
Isso digo, e ponho fé,
Doce coceira que arde,
Parece bicho de pé...

Trovas

Vi meu barco na calçada,
O meu carro foi pro mar;
A minha mulher amada,
Vive escondida ao luar...

O que quero sei de cor,
Mas não sei se isso é verdade;
A catinga da Loló,
Apaixonou o compade...

Aninha, quando menina,
Andava sempre fagueira;
Tentava dobrar esquina,
Banho de sol? Na fogueira...

Belinha é muito bacana,
Todo mundo sempre diz;
Eta garota sacana!
Mas bem sabe ser feliz...

Não sou mais que cercania,
Quem me dera ser divisa;
Não consigo ver o dia,
Quero sentir doce brisa...

Poemas. não sei fazer,
De rimas não sei falar;
Meu amor, cadê você?
A procuro no luar...

A lua que brilha aqui,
Não é a mesma de lá;
Pois na terra onde nasci,
Rouba luz do teu olhar...

Quando nasceste, Ritinha,
Toda terra festejou;
Relampeou, de noitinha,
Até Deus comemorou!

Meu amor não tem segredo,
Nem precisa de recado;
Com você perco meu medo,
Coração descompassado...

Num momento infeliz tu me disseste

Num momento infeliz tu me disseste,
Que poderia até, de mim, gostar.
Achei, por um segundo, ser um teste,
Não cria ser possível. Me enganar!

Por horas, dias, meses, sul e leste,
Em todos os lugares; só pensar
Nisso... Hoje percebi que o que fizeste
Fora somente chiste. Devagar,

A vida transformada em maravilhas,
Sonhando sem, ao menos, ter mais medo...
Voando sem ter asas, novas trilhas...

Conhecer, sentir, todo esse segredo!
Naufragar nas mais belas dessas ilhas...
Agora sei, retorno ao meu degredo...

Minha mansidão luta ferozmente

Minha mansidão luta ferozmente
Contra as dores cruéis. Minhas entranhas
Latejando; senil vai minha mente,
Buscando, temerária, tuas manhas.

Em muitas outras horas, fui contente.
O preço: em minhas costas, tantas lanhas...
Por outro lado, sendo continente,
De todas as maneiras, sempre ganhas!

Fingi ser bem mais forte do que creio,
De nada adiantou tanto disfarce,
Não consegui sentir, palpar teu seio,

Somente dar um beijo em tua face...
Quem dera conhecer, tão rico veio.
Talvez soubesse, assim, como te lace...

Contra senso

A podridão do corpo começara,
Sentira o gosto azedo, fecalóide,
As mãos se decompunham, já notara.
Do cérebro porções dum alcalóide

Esparramavam pelo chão... U’a vara,
Logo atravessaria seu mastóide,
Deixando à mostra tudo que almoçara.
Sentia-se zumbi, talvez andróide.

Mas nada de chegar a morte santa,
Redentora de tanto sofrimento.
A cabeça rodando, se levanta;

Cai em seguida. Pútrido, seu mento
Abrira tantas fendas... Ele canta
Incrivelmente, goza co’o tormento!

Estrada empoeirada, tão distante

Estrada empoeirada, tão distante,
Seguindo sempre a esmo, sem chegada.
O rumo que procuro: p’ra adiante,
Para onde irei, nem quero saber nada...

No passado pensei que era gigante,
Mas a vida mostrou como era errada
E cega essa visão toda embaçada.
Percebi, sei que tarde: ela é mutante...

Não quero mais ninguém a minha espera,
Nem pai, nem mãe, amores, sina fado...
As curvas dessa estrada, torpe fera...

Sem ter ninguém nem nada, des’perado...
Coração deu lugar: uma cratera,
Sem teu amor, morrer; rumo traçado!

Soneto com estrambote - Fechadura

Logo que chegas, vindo de onde vens,
Procuras ao entrar, a fechadura...
A chave introduzindo... Parabéns!
Acertaste sim, mesmo noite escura

Não impediu tal glória! Sei que tens
A mansidão divina da brandura...
Mas, irado, ferido nos teus bens
Ou no brio feroz, tal armadura

Demonstra tua raiva sem sentido!
O que fora brandura se transforma,
A mansidão, deixaste pelo olvido...

Com tanta estupidez, de bruta forma,
Tu tentas penetrar, estás perdido,
Pois logo, sem porque, tudo deforma...

Aquele “bravo” sujeito,
Mais calmo, fica besteiro...
Diz, lá no fundo do peito:
Meu reino por um chaveiro!

Soneto com estrambote - Vassoura

Quando chegas na casa abandonada,
Sem ter ninguém, por muito tempo, triste.
Percebes ao chegar, logo n’entrada,
Que nada mais cruel no mundo existe...

Da porta vês a sala empoeirada,
Nos quartos; só sujeira é que resiste.
Sozinha; neste canto, desprezada,
Sou lembrada enfim, cedo tu me viste...

Então, começarás limpar sujeira,
Esfregas, sem ter pena, todo o chão,
Empapuças-me, toda na poeira...

Depois, serei jogada num galpão,
Triste sina essa minha, a vida inteira,
Sou fiel companheira, mas em vão...

Vou deitar-me na despensa,
A minha sina é tão torta,
Se a visita não compensa,
Aí vou pra trás da porta...

Sunday, August 20, 2006

Soneto com estrambote - Quando tu vens, cansado viajante,

Quando tu vens, cansado viajante,
Dessas tuas longínquas caminhadas,
Atravessando rota fatigante,
Sob o sol escaldante nas estradas...

Muitas vezes, sedento e radiante,
As notícias virão emocionadas,
Ou mesmo em tais momentos, inconstante,
Nos rapa-pés das gentes educadas...

Num primeiro momento sou lembrada,
Pouco tempo depois, virei poeira,
Depois ninguém mais pensa, não sou nada...

Desprezada num canto, a companheira,
Que tanto te servira mas, quebrada,
Ó vingança cruel dessa cadeira!

Te levo ao chão, de primeira,
Tua nobreza s’afunda,
Quando cais de mim, cadeira,
De novo rachas, a bunda...

Soneto com estrambote - Uma gota feroz no meu telhado

Uma gota feroz no meu telhado,
Pingando sem parar; horas adentro...
Estou ficando até desesperado,
Como posso pensar, como concentro?

Queria te falar apaixonado,
Mas como? Essa goteira bem no centro,
Batuca no seu ritmo desgraçado,
Penso que, na cabeça bate dentro...

Tumtum não pára nunca de bater.
Tumtuneia não cansa; a noite inteira...
Eu tento, não consigo reverter.

Minha amada, te juro; é verdadeira,
Essa emoção que quero transcrever:
Odeia poesia essa goteira!

Então perdoa querida,
Por favor, não leve a mal,
Dess’amor nem Deus duvida,
Sem ele passo até mal...
Teu amor é minha vida,
Eta goteira infernal!

Dimitri, filho amado, na pureza

Dimitri, filho amado, na pureza
De teus olhos, espero pela glória!
Caminhando tropeças em beleza
Teus passos, transformaram minha história...

Teu velho pai, tristonho na certeza
De saber que jamais, pobre memória,
Teria a paz, inquieta natureza...
Vê agora a, outonal, vida simplória...

Meus versos; um pedido: foram vãos,
Os dias que vaguei sem cabimento,
Vagando tempestades e lamento,

Sentindo sem saber o sofrimento,
As carícias trocaram-se de mãos:
A ti peço perdão e a teus irmãos...

Se eu falar de saudade, diga nada Sextilha

Se eu falar de saudade, diga nada,
É simplesmente verso sem sentido,
Amando vou levando, de empreitada,
O tempo que jamais achei perdido.
Das horas nem por ora faço caso,
Em meio a tantas farsas, em me embraso...

Sem fleugma, sem vergonha, mentiroso,
Invento dores, falsas cãs atéias.
Meu mundo nem sequer é sulfuroso,
Não tive nem rainhas nem plebéias,
Sou resto, rimo sempre por rimar,
Nem tenho céu, quiçá terei luar...

No jogo da permuta me lasquei,
Troquei não ser feliz por fantasia,
Confesso então, vadio já pequei,
Nem esperei sequer raiar o dia,
Montei no meu cavalo e fui embora,
Não soube nem talvez irei agora.

Quem sabe, na manhã que vai nascer,
Eu possa, simplesmente ser feliz,
Procuro em toda moça por você,
Cadê? Onde andará a minha miss...
Então por não saber dessa Maria,
Desconto na cachaça – poesia!

Sextilha - Dos amores que tive, e foram tantos

Dos amores que tive, e foram tantos,
Das mulheres que em sonhos concebi,
Meus dedos, nas carícias, nunca santos,
Tantos planos, enganos, que vivi...
Foram peças cruéis do meu destino,
Matando aos poucos, sonhos de menino...

Nas mais diversas camas, chama ardeu...
Nas mais divinas bocas, naufraguei,
Embora tanta glória se perdeu,
Julgava, tolamente, fosse rei...
Percebo, na tardinha dessa vida,
Que em cada encontro, havia despedida...

Silenciar feroz dessa existência,
A noite s’aproxima, vem inteira,
Procuro noutros braços por clemência,
Encontro a solidão por companheira,
Não quero mais sentir esse bafio,
Nem quero mais lutar, nem desafio.

De todas essas fêmeas tão ingratas,
As almas gêmeas foram simples mito,
A voz cansada, tantas serenatas,
Nem pretendo sonhar, digo e repito.
As tive todas, ‘té de santo véu,
Somente a poesia foi fiel!

Soneto Sertanejo

Trago os ói de sodade machucado,
Da tristeza d’amô que me dexô,
Pulo céu avoando, fais riscado,
Num curisco carregadim de dô,

Apois bem, se calô disisperado
No sertão, tanta tráia já levô,
Meus amô trupicando ansim de lado,
É pruque marvadeza carregô!

Coração, no meu peito, faiz vexame,
Bateno, sem compasso, sem medida,
Dotô, num necessita nem exame,

Do jeitim que esse cabra feiz da vida,
Num tem nada que sente nem reclame,
Amô discompassô sua batida...

Sextilha - A minha poesia me sustenta

A minha poesia me sustenta,
Do que mais necessito p’ra viver,
Quando busco dessa água, alma sedenta,
Sacia sua sede de saber,
Na fonte maviosa e cristalina
Que só na poesia surge, mina...

Quanto mais vou faminto, mais preciso,
Desse maravilhoso, bel repasto,
É pão... dessa ambrosia eu como e biso,
Afastando o temor, cruel, nefasto...
De sentir, madrugada afora, fome,
Poesia-banquete me consome...

Ar que respiro, base para a vida,
Sem ela, poesia, me sufoco.
Força mantenedora, minha lida,
Nos meus versos, amores eu estoco...
Eu pergunto-te então, como seria,
Se não houvesse enfim, a poesia...

Oitavas camonianas - Meu primeiro amor...

Meu primeiro amor, longe de ti, sei
Das quimeras vorazes da saudade,
Viver sem ter amor, viver sem lei,
Não conhecer nem sombra do que há de
Melhor de nossa vida; triste rei,
Num reinado onde vive sem alarde,
Sem ter paz nem dilúvios nem ter sonho,
É viver e morrer tédio medonho...

Amor, na tempestade, calmaria...
Ilumina com trevas nossa vida,
Eclipse total cega em pleno dia,
Achando que se sabe, mas perdida...
Julgando ser mais plena; mas vazia.
Amor, suor, batalha; dor bandida;
Que acalenta, conforta, me ameniza.
Meu amor vendaval que julgo brisa...

Te busquei sem saber onde encontrar,
Provoquei minhas ânsias na procura.
Fui ao sol, tentativa de luar,
Traz toda claridade, noite escura...
Quero, em pleno deserto, navegar...
Amor és a doença e também cura!
Nada mais que completo, fracionado,
Esperança traduz: desesperado...

Sextina II


Pois eu tanto quisera ser feliz,
Ninguém mais, com certeza, merecia,
Tantas dores carrego, nego o bis,
A vida me deixando a poesia,
Tudo que falo, nada mais me diz,
Me deixando, somente, fantasia...

Quem me dera viver a fantasia,
De cavalgar solene e tão feliz,
Mas a saudade, cega, vem e diz,
Quem amou assim, tanto merecia,
Mas de tanto viver na poesia,
Felicidade deixou, sem seu bis...

Perdido pela sorte sem ter bis,
Nem chance de tentar, sem fantasia,
Me perco, vago mundo e poesia,
Ness’altar que sonhei, viver feliz,
Hoje, enfim eu percebo, merecia
Bem mais que essa tal sorte vem e diz...

Não quero mais saber o que é que diz,
Quem me negou poder, num novo bis,
Achando que jamais eu merecia,
Só por acreditar na fantasia,
Que me fez incapaz de ser feliz,
Por viver impossível poesia...

Quem, portanto, acredita poesia,
Quem por ela morrendo, tudo diz,
Acreditando nela ser feliz,
Mesmo tendo na vida, todo o bis,
Por ela viverá da fantasia,
Sem ao menos saber se merecia...

Mas talvez, melhor sorte merecia,
Quem amou vida afora a poesia,
Eu sou seu prisioneiro, fantasia...
Vem; chega devagar, então me diz:
Pelo amor do Senhor, último bis,
Me deixe, num segundo, ser feliz...

Eu quero ser feliz, bem merecia,
Amor eu peço bis, na poesia;
Vem correndo e me diz: é fantasia?

Meu amor, quando escuto o canto triste

Meu amor, quando escuto o canto triste
Da araponga, trazendo chuva ao chão,
Recordo como fomos, no que insiste
Ser mais forte punhal, a solidão...

No que sonhei pudesse e não resiste,
No tanto quanto quero não ser vão,
A metade querida qu’inda existe,
Enquanto outra vagueia no sertão...

Meu amor, nos meus vagos vergalhões,
Nas entranhas doídas do que negas,
Quero te conceber nessas canções,

Na nossa estranha dívida que pregas,
Nas cantigas de roda as soluções,
Vou vazio, caminho onde navegas...

Eu vou devorando árvores, pensares

Eu vou devorando árvores, pensares,
Pesadelo feroz sem ter limites.
Nas montanhas terrenas, cãs solares...
Quero sorver demais, meus apetites...

Não consigo levar aos teus altares,
Nem as dores perdão, nem meus convites
Para transmudar nossos céus, luares,
Nem por tantos lugares ond’habites...

A minha serenata não tem rima,
Minha manhã, jamais renascerá.
Minh’alma vai descendo, nada estima,

Eu quero simplesmente ir para o mar,
Mas se o mar já secou, morte vitima,
Não deixando mais nada, nem sonhar...

A estampa na parede demonstrando

A estampa na parede demonstrando
O retrato cruel do fim do mundo,
Vagabundo meu mundo vai rodando,
E mal quando eu percebo; já me inundo,

De toda crueldade, m’afogando.,.
Qual abissal marinho, sou profundo,
Me resta tão somente esse segundo,
A vida nada vale mais, estou brando...

Incrivelmente, brando nada temo,
Espectral fantasia tudo toma,
Minha vida vai trôpega, sem remo,

Mas nem mesmo o temor a dor se soma,
E de encanto tenaz, incrível, gemo...
A morte não será mais que esse coma...

Festa vai começar nesse terreiro,

Festa vai começar nesse terreiro,
Com o canto feliz da mocidade,
Orgulho batuqueiro brasileiro,
Disparando no peito, na verdade...

A cachaça que eu bebo com vontade,
Nosso churrasco assando no braseiro,
Tanta porrada traga essa saudade,
O sorriso cai falso, e verdadeiro...

Nossa vida tá dura, que me importa?
Patrão me despediu, quero beber...
Tristeza vai ficar, lado de fora...

Eu quero rosetar, nem sei por que...
Quero festa, senão eu vou embora...
É tudo que preciso pra viver...

O meu olhar cadê? Você levou

O meu olhar cadê? Você levou...
Deixando tão somente esta distância
Que nunca mais traduz o que restou,
Fez do meu coração, u’a triste estância,

Onde esperança, cega, s’arribou...
Talvez possa dizer, foi petulância
De quem amou demais; por fim, levou
Seus cacos carregados na ambulância

Em busca de curar o que não cura,
Nem pretenderá toda medicina.
A dor da solidão, nem toda jura

Nem reza, benzeção, nem a morfina,
Podem amenizar, nem atadura
Estanca essa sangria... Desatina...

Nunca mais sentirei tanta saudade

Nunca mais sentirei tanta saudade,
Nem de ti, nem das dores que me trazes,
Caminhando, sozinho, na cidade,
Vou mutante, permito tantas fases.

Qual inseto, crisálida da tarde,
Voarei no futuro, são audazes
Os meus sonhos, buscar felicidade...
De todas migrações, o novo invade...

Eu serei novamente o que perdi,
A larva rastejante que morreu,
Tanto tive, calado estou aqui...

Ressuscito meu cálice no breu.
Trevas, pregas, praguejo; vou a ti.
Pensamento persegue, sigo ateu...