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Sunday, December 23, 2007

SONETOS 109 E 110

Morrer de amor! Decerto, em seu mistério
Eu tantas vezes perco-me a cismar.
Amor é sentimento sem critério
Que invade; com doçura, imenso mar,

Derruba em mansidão um grande império
E faz de simples sonho, um raro altar.
Ridicularizando um homem sério,
Trazendo em santidade um lupanar.

Morrer em alegria, em tal loucura
Que nos transtorna e rouba a direção.
Somente quem amou sabe a tortura

Na qual ele nos faz em perfeição.
Quem vive sem amor, não sabe a cura
Que a dor proporciona em redenção...

X


Quem dera se eu tivesse este pendor
De ser o companheiro predileto
Andando junto a ti, mesmo em deserto,
Ninguém me julgaria um sonhador.

Mas longe do carinho e sem afeto,
Restando este vazio a me compor,
Meu peito, vago e só, tão sofredor,
De uma felicidade encontra o veto.

Beijar, como beijei, a tua boca,
Quem dera... Fantasia quase louca
Guardada dentro em mim, qual um segredo.

Agora que percebo amor distante,
Não resta nem sequer mais um instante
Apenas me sobrou triste degredo...

X

Angústia! O pensamento não disfarça
E esvai toda alegria que encontrara.
A sorte prometendo outra trapaça
Mostra a felicidade longe. Rara...

Uma ilusão que sobra já se esgarça
Qual fora um porto triste em vida amara,
A vida parecendo dura farsa
Abrindo no meu peito funda escara...

A solidão voraz que se propaga
Deixando tão somente um sonho atroz.
Meu barco se perdendo, em forte vaga,

Silêncio vai tomando a minha voz.
A luz que iluminava enfim se apaga,
E a dor vai invadindo, mais veloz...

X

A noite devagar, chegando mansa
Trazendo uma amargura, dentro em mim.
A dor desta saudade já me alcança
Penumbra vai caindo. É sempre assim.

A festa que se foi, sem sequer dança
Tramando uma tristeza que sem fim
Aos poucos no vazio já me lança.
Quem dera se restasse algum festim

E a vida não seria tão amarga,
Meu canto poderia ser mais belo.
À lua, feiticeira, eu não revelo

Os sonhos que perdi, há tantos dias.
A voz quase silente, inda se embarga,
Lembrando das passadas alegrias...

X

A solidão em flor nasceu no meu jardim
E em seu perfume amargo, um gosto de saudade.
Neste momento insano, amor dentro de mim
Refeito da loucura; em incivilidade

Estorva
meu caminho, e quase que no fim
Avança escuridão, matando a claridade.
Que faço se não posso amar demais assim.
Procuro uma resposta. Apenas inverdade.

Tal flor apodrecendo aqui no meu canteiro
Afasta o colibri, espanta a fantasia.
Seguindo um mundo falho em passo traiçoeiro

Eu busco em esperança, uma última aliada
Nos braços desta amiga, a sorte inda me guia
Somente ela resiste. E depois, sobra o nada...

X

Esmero esmeraldina sensação
Dos olhos da mulata que sonhei.
O verde que esperança em coração
Nas
turmalinas vertem minha lei...

Das hortelãs e mentas, meu refrão...
Dos peixes que – menti – jamais pesquei
Qualquer piaba vira tubarão.
Com sereia postiça me encantei...

A sensação que nunca me alucina
Se faz em tempestade e é calmaria
A moça embriagada se faz fina,

A lua que brilhou traz pleno dia,
Amor sem ser morfina, me amofina
A pedra que te dei? Bijuteria...

X


Bendito seja amor que nos tortura,
Maltrata e nos corrói, depois redime.
Bendita essa mulher, que eu não estime
Outra, pois nela encontro minha cura.

Bendita seja a lua em sua alvura,
Que em seu louvor minha alma sempre prime.
Que meu verso em delírio sempre rime
Em toda essa altivez, toda brandura...

Bendito seja o sol, também a chuva,
Bendito seja o vinho, feito da uva
Imagem da mulher em fantasia

Bendito
seja o cio que transtorna,
Cálice do prazer, no gozo entorna.
Bendito nosso orgasmo dia a dia...

X

Fugindo desta sombra eu te encontrei,

Andando pelas ruas sem aprumo...

Depressa para a luz, quando levei,

Achei que te daria novo rumo...

Contigo muitas vezes caminhei

Te dando da esperança todo o sumo,

Um canto mais feliz imaginei,

Até te dei minha alma... Não perfumo

As mãos mais em teu corpo, minha amada.

Pois foste como estrela decadente

No final da tarde, sobrou nada

Senão uma saudade negra, escura...

Pensei fazer-te assim, bem mais contente.

A tua ausência agora me tortura...

X

Quebrando este telhado que te abriga

Do frio, da saudade e da tristeza;

A sorte que te fora sempre amiga

Abandonada, busca noutra mesa

Repasto. Tu quebraste a forte viga

Que tanto sustentou; qual fortaleza,

A relação mais forte e tão antiga

Onde eu não esperava tal surpresa...

Amiga... Já pressinto que a desdita

Virá te acompanhar no dia a dia...

A sorte que tu pensas ser maldita

Foi quem te iluminou por tanto tempo...

Matando toda a fonte da alegria,

A vida te trará só contratempo...

X

Bem sei que me tomaste por cordeiro,
Quebrando em sacrifício o meu pescoço,
Causando em minha vida um alvoroço
Ciúme sem dar trégua, e costumeiro.

Quem dera fosse o tempo mais ligeiro,
Talvez inda restasse um simples osso
Inteiro. No começo: que colosso!
Amor me parecia alvissareiro...

Porém com incertezas sinalizas
Tomando com vigor o meu juízo,
Não passas sem ferir e martirizas

Fazendo com que perca logo o siso,
As mãos que me torturam, as divisas
Usadas por quebrantos, e agonizo...

X


O poder que traz uma amizade
Nos molda para a luta, esteja certo,
Escuridão valora a claridade,
Oásis se enobrece no deserto.

Apenas a distância mostra o perto,
Uma ilusão seduz realidade
Porém somente em plena liberdade
A gente reconhece um peito aberto.

Assim quando se faz a tempestade
A calmaria é tudo o que queremos,
Por ela nós lutamos e sabemos

Que nós temos na paz, finalidade,
E enfim poder contar com alegria
Vivendo nossa vida em harmonia...

X

Amigo tantas vezes perguntei
À vida por que dores ela traz.
Em um momento triste, a dura lei
Mostrando do que a dor é mais capaz

Por um segundo, enfim, desanimei
Sofrendo tal tormenta, nada apraz;
Na morte, meu amigo, até pensei,
Por que viver se nada satisfaz?

Porém num dia calmo eu obtive
Uma resposta clara e verdadeira
A gente, com certeza, sempre vive

A vida na procura de um apoio,
E Deus em atitude alvissareira
Nos fez em plena dor, saber do joio...

X

Uma amizade é feita aos poucos; com constância;
Ultrapassando sempre as curvas do caminho.
Mais forte na tristeza até que na abundância
Certeza de um apoio emana do carinho

Amizade se afasta onde entrar a ganância
Sincera proteção que faz valer o ninho
Mesmo que separado, amigo desde a infância
Eu sei que uma amizade é feita como o vinho

Que tem bem mais valor quanto maior o tempo
Vencendo a tempestade e o risco do azedume,
Lutando com tal força ao vencer um contratempo

Alimenta nossa alma e traz em seu perfume
Que vale bem, querido, o risco de um espinho.
Quem sabe o seu valor, jamais irá sozinho...

X


Ela sempre retoca o seu batom
Não deixa nem sequer saber seu nome...
Viaja o pensamento, eleva o tom
O quadro que apresenta me consome,

São tantas as batalhas neste front
Meus olhos a procuram, e ela some
Eu sigo rastreando cada som.
Espero que me dê seu telefone

O bem que me quisesse nunca viu,
Perdi o meu caminho em bem-me-quer
Também a flor, decerto já mentiu

Pois sei que ela também se faz mulher
De coração volúvel, mesmo vil.
E sigo perguntando: ela me quer?

X

Passarinho que canta na janela,
Sabiá laranjeira, companheiro...
Me responda se acaso o mundo inteiro,
Alguém pode falar onde está Bela?

Belinha, abelha, bela bel tinteiro
Das cores que roubei nada restou
Responda passarinho companheiro
Por quê que minha Bela me deixou?

Os fios da meada eu já perdi.
As chaves destes cofres eu não tenho
No medo de viver, assim morri

Somente amor imenso inda retenho.
Que faço, meu amigo passarinho,
Sem Bela nunca mais farei meu ninho...

X

Qual sílfide, delícia encantadora...
Trazes a languidez das brancas rendas.
Na boca carmesim tão tentadora,
Ardor pecaminoso invade as tendas

A noite em que chegaste, redentora,
Caminhos, espirais, dolentes lendas.
Sonora melodia sedutora
Lascivas, sensuais divinas sendas...

Sonatas e perfumes, canção, rosa....
Veludos, maciez; camurça e gozo.
A mão que te procura, carinhosa.

Palácios dos prazeres, catedrais.
Desejo de viver, voluptuoso,
Tua beleza rara, meus cristais...

X

Lua bela em teus raios de cristal
Encontro tal beleza, deslumbrante
Qual fora um mavioso diamante.
Dos astros tu és sempre a maioral.

Teu toque tão macio e sensual
Para quem ama mostra-se excitante
Por isso és a rainha de uma amante
Que deita sob a prata sem igual.

Ah! Lua, companheira e tão amiga,
Não permita que a dor assim prossiga
Na eternidade rara deste abrigo

Afaste a solidão do meu caminho,
Não deixe que eu me sinta mais sozinho,
Eu quero esta mulher sempre comigo!

X


Por mais que te pareça insensatez, amigo,
Eu faço da loucura a minha companhia
Permito-me sonhar e adoro a fantasia
Pois nela encontro sempre o meu maior abrigo

Uma defesa plena aliada comigo,
Por vezes imagino a dor que eu já teria
Não fosse insanidade em lúcida magia
Meu trem descarrilava em trágico perigo.

Desculpe se pareço um torpe vagamundo
Correndo sem parar, sorrindo do vazio
Um mundo imaginário, amigo eu sempre crio

E vivo dentro dele, e nele eu sempre inundo
Uma alma visionária, um coração sem rumo.
Amigo, na loucura, encontro paz e prumo...

X

Na bruma em que te escondes, Solidão,
Sentindo-me falena em busca ao lume,
Aguardo o seu carinho, uma ilusão,
Na cura que se mostra de costume...

Vagando sem ter rumo, na amplidão,
Espreito e vou imerso num queixume,
Às voltas com beleza; solução,
Da mulher que inocula o seu perfume....

Chegando para o náufrago qual bote,
Que salva da terrível tempestade,
Amor é muito mais que simples mote.

Essência de uma vida salutar.
Não posso conceber felicidade,
Sem lua que esparrama-se no mar...

X

Amor não se consola quando só,

Um par precisa sempre d’outra face.

Senão a vida volta ao velho pó,

Aí, ninguém dá jeito nem disfarce...

Eu quero o teu desejo; vem sem dó,

Permita, devagar que eu já te enlace.

Te trato, meu amor, a pão de ló

Mas faça-me feliz. Amor renasce

Na fúria e no delírio de uma noite.

Eu quero ser a caça e te caçar,

Mas venha com certeza, não se afoite

Pois tudo o que fizermos nos tempera

No gosto e no desejo de sangrar

O coração exposto à mansa fera...

X

Qualquer que seja o fim desta batalha
Não restará semente sobre o chão.
No corte agonizante da navalha
A vida se mostrou simples senão.

A mão que me acarinha já retalha
Deixando em posta, pronta podridão.
As marcas desta algoz, a solidão
Apenas decepção, sempre amealha;

Um resto do que fui caminha a esmo.
De perto, reparando sou eu mesmo
Aquele que sonhara, em pesadelo

Levando
uma saudade sem limites.
Enreda com vontade no novelo
Da morte que não quer sequer palpites...

X

Meu corpo com certeza irá esquálido
Levando o que restou de um ser patético.
O verso se mostrou bastante inválido,
Distante do que julgo ser poético.

Ausência de um verão que fosse cálido
Não vejo mais que um sonho e antiestético
Apodrecendo inerte, sigo pálido
Num paganismo intenso, sempre cético.

Quem ver-me, quase um verme sem valia
Não sabe que eu amei, sonhei, sofri.
Porém saudade mata uma alma fria

E nada sobrará decerto, aqui.
Apenas estrambótica visão
Do que só fora uma alucinação...

X


Antes que a solidão provoque o corte
Ao entalhar minha alma, inda ressoa
Uma esperança altiva que revoa
Poupando-me decerto, enfim da morte.

A vida é bem melhor p’ra quem é forte
Mostrando tantas vezes ser tão boa
Mudando, num segundo nossa sorte,
Trazendo a placidez de uma lagoa.

Porém quando em tempesta, é dura a vida,
Difícil vislumbrar qualquer saída
Se temos nossos dias infecundos.

Mas ao nos agregarmos com vontade
Nos laços bem mais firmes da amizade
Bastam para mudar poucos segundos...

X

Descendo pela estrada tão umbrosa,
Hordas de passarinhos rumorejam.
As horas vão passando e se negrejam
Prevendo a noite imensa e tenebrosa.

Apenas pirilampos que vicejam
Tornado esta passagem luminosa
As cores tão distantes se desejam
Restando então espinhos, morre a rosa.

Solidão me encontrando em indolência
Moldando
em meu caminho uma impotência
Capaz de não deixar restar mais nada.

Porém ao perceber tal soledade
Encontro todo apoio na amizade
E a vida se transforma, iluminada...

X

Por vezes necessito ser guerreiro
É quando a tempestade já se assoma
E torna o meu destino prisioneiro
E o nada num segundo enfim me doma.

Porém ao ter abraço verdadeiro
A vida se refaz em nova soma
E o mundo se mostrando companheiro
Com toda força chega e assim nos toma.

Meu coração não teme mais arenas
Distante dos vorazes cães, hienas,
Abutres que nos bicam sem parar.

Na força, com certeza, da amizade,
Encontro todo apoio e na verdade
Consigo bem mais forte caminhar..

X

O medo de sofrer que me tomava
Morria ao perceber teu braço forte
Sabia que, decerto eu encontrava
Poder que nos transforma dando um norte.

A solidão que queima feito lava
Provoca dentro da alma um fundo corte.
Muitas vezes sozinho então cismava
Distante do que penso ser a sorte.

Em procelas,às vezes somos vítimas
Tempestades convulsas, más, marítimas
Tomando já de assalto o meu saveiro.

Mas tendo uma amizade timoneira
A calmaria volta costumeira.
Que bom ter um amigo verdadeiro...

X

Ao dar-me a sensação de tal brandura
Erguendo-me, sutil, por longos ares
A noite se emoldura na ternura,
Trazendo a inconstância dos luares.

Tuas mãos amicíssimas. Candura
Que se harmoniza em todos os altares.
A mansidão que trazes, fina alvura,
Aumenta a sinonímia para amares.

Elfo; flutuas. Zéfiro, me acalmas...
Nas janelas abertas dos amores,
Acaricias, plena, mãos e palmas.

Emanas tal perfume que estas dores
Não restam sobrepondo aos velhos traumas.
Borboleta; revoas sobre as flores...

X

Qual triste borboleta, vou a esmo,
Nas gotas deste orvalho, sem paragem...
Amor que nunca mais será o mesmo,
Descansa, sem ter bálsamo. Miragem...

Nas promessas divinas, me quaresmo,
Não quero nem permito estar à margem.
Por vezes, tão calado, se ensimesmo
É medo de trocar, nova roupagem...

Crisálida que dorme não se esquece,
A dor deste fantasma que persegue
Não basta a conversão sequer a prece.

A mansa borboleta nunca nega,
Por mais que tantos mares eu navegue,
Como é pesado o fardo que carrega...

X

Qual fora um arvoredo em fortes, vários galhos,
Moldando o meu caminho- estrada derradeira,
Em busca de- quem sabe- achar meus agasalhos
Nos braços de quem amo. Estrela costumeira

Vagando no meu céu. Porém em atos falhos
A vida se mostrando expondo esta canseira
Que é feita em cada passo, em colchas de retalhos
Talvez inda me traga a lua plena, inteira...

Bem sei que não terei sequer felicidade
O que dizer assim da longa eternidade
Que se promete dura, em trevas, sem descanso.

Porém me bastaria, uma falsa amizade
As sobras que virão em dura realidade
Já deixariam, sim, meu coração mais manso...

X

Envolta em tanta luz, na noite mais espessa
Nas fimbrias desta lua, adormece em martírios.
O vento descobrindo impede que se aqueça
Mostra para quem ama e trama os seus delírios

Beleza que não tem quem não mais obedeça
E siga já buscando em procissão de círios
Mulher tão magistral, embora a sorte avessa
Impede que eu consiga a cura dos colírios.

Pudesse eu mitigar a dor da solidão
Ao ter sempre comigo esta beleza rara.
Mas nada conseguindo, apenas me contento

De ter sua amizade. E conter ilusão
De um dia enfim poder, que o tempo nunca pára,
Ter seu amor pra mim. E ser – quem sabe- o vento...

X

Lembro-me da visita que fizeste
À casa dos meus pais. Era menino.
Do brilho alucinante que trouxeste,
Parecias um sol... Perdi meu tino.

O tempo foi passando e não vieste,
Um homem triste surge. É meu destino?
Viver passou a ser eterno teste.
A sombra de teus passos... Desatino...

Lembro-me da visita, a porta aberta.
O medo bem distante. Que saudade!
Agora novamente, já desperta

A vida traz visita, ainda incerta
Será que encontrarei felicidade?
Mas entre aqui, Amor. Fique à vontade...

X

Bom dia, meu amor, quanta saudade!
Faz tempo que não sinto seu carinho...
Ao seu lado, porém, se estou sozinho
O seu sol me inundando em claridade

Quem
dera se pudesse, na verdade,
Falar do nosso amor, o pobrezinho,
Como aconchego mágico de um ninho,
Talvez fosse um bom dia de verdade.

Bem sei que amor transforma-se depressa,
Que aos poucos não nos resta nem conversa.
Fica monossilábico, calado.

Não passa do bom dia sem sentido.
O vento que nos trouxe está perdido,
Num canto dessa casa, abandonado...

X


Pacato cidadão espera quieto,
Assim mudança é traça no Congresso.
Calado, permanece morto o feto,
Medalha nunca mostra o seu reverso.

Quem cala é que por certo está repleto
Quem vive desunido e vai disperso
Pois rã que não se move quer inseto?
Quem diz que da política é avesso

Permite por terrível omissão
Que dê sustento ao crápula quando erra
Deixando o mais humilde pelo chão.

A noite do cochilo cria e emperra
Pois oportunidade faz ladrão,
E o bom cabrito, amigo, sempre berra!

X


Nos botecos da cidade
Eu me sentindo em Havana
Cativa
sinceridade
Quem conhece não se engana.

Maria da Soledade
Minha Musa soberana
Entranhada na saudade
Transformando noite insana,

Aguardente que me traga
A noite nunca tem fim.
Boneca de porcelana

Nos seus dentes de marfim,
Rosário de perna abana
E me engole feito draga...

X

Bases frondosas: árvore esperança...
Grinaldas buquês, festas, despedidas...
Alabastrinamente vão vestidas
O que restará dessa contradança?

O que tenho melhor- amor - avança;
As tardes que deixei estão perdidas...
Nos meus dedos, meus medos são feridas.
Nas bodas, tuas bodas, a criança

Morta, ressurge, tímida, reclama...
Perco-me, cego, morde a dor que inflama
Te perder foi atroz, mal tumular...

Escadarias, luzes, enlutado...
Tais esperas, festejos, triste fado...
Quem me dera jamais poder amar!

X

Não temo a sorte, corte; quiçá trevas.
As neves,tuas preces, nem teu rogo.
Espero, espreito, oculto, sei teu jogo...
Nos rios, ritos, sinto quando nevas

Nas almas, dores, flores, tudo levas...
Teimando em glosas, queimas, cessa o fogo;
Embora tão distante, és desafogo..
Na tua mansidão a todos cevas,

Esperando, espreitando, na tocaia,
Tocas, retocas, sabes dar o bote...
N’hora certa, entoando o velho mote...

De ti, cada momento, que se espraia,
É como navegar , teu rumo, norte...
Nossa boda infalível... Velha Morte!

X

Nas bocas que beijei; mesmo veneno.
Na luz de cada dia, um novo amor.
Nas cordas que se partem, tombo pleno
Amor cortando em faca, sonho e dor.

Sem brilhos, mas tenaz, eu já te aceno.
Prometo tão somente o meu torpor.
Talvez por ser tão manso e tão sereno
Não brotam as sementes, sem calor.

Mesmo assim ao sentir um ato falho
Parece que das bocas que beijei
Alguma poderá ficar comigo.

Sem temperos, faltando sal, sem alho;
Amor que te proponho pede abrigo
Em sonhos tão vazios, temperei..

X

Meu ser que se fez cinzas de um cipreste
Que outrora sombreava calmamente,
Nas dores por herança que me deste
A vida se perdendo tolamente.

Somente a solidão inda me veste
E aos poucos me transforma em vão demente.
O não quando meus olhos o puseste
Em vendas tudo nega, cegamente.

Revejo nos meus dias, juventude,
Um rosto de belíssimo fulgor.
Não sei e nem concebo como pude

Perder o manto claro deste amor.
A mão desta saudade, fria e rude,
Matando, sem ter pena, um sonhador...

X


Jamais irei viver alvorecer
Em paz, leve sorriso eu já não tenho.
Quem teve da alegria o seu empenho
Percebe quanto é duro perceber

Que a sorte abandonada, de onde venho,
Deixando bem distante o meu prazer.
Apenas sofrimento, enfim, retenho,
No sonho uma vontade de morrer...

Perdida, bem distante, a mocidade,
Um resto de esperança esvai agora.
A dor que no meu peito já demora

Resume o que senti na realidade.
Meu canto, sem sorrisos, não resiste...
E morro devagar, vazio e triste...

X

O mar que em tempestade me transporta
À praia dos meus sonhos, dor imensa.
Deixando sem tramelas, minha porta,
Quem sabe em minha morte, a recompensa...

A negritude da alma, tão imensa,
Nem mesmo um sonho vem e me conforta,
Estrada em que passei, antiga e torta,
Na tosca solidão, cruel e densa

Encontro esta tristeza que se soma
Ao medo de viver em sofrimento.
O mar que na loucura de um tormento,

Em ondas movediças tudo toma.
Seu canto me transporta em agonia
Deixando
este sabor de maresia...

X

Teus lábios neste cálice de vinho,
Mostram sensualíssimos desejos...
Tua boca cintila loucos beijos,
Resplandecente flâmula, meu ninho..

Belas cores carnais, rosas, espinho...
Constelarei delírios e traquejos,
Perpetuarei tais matas e verdejos.
Embora, tantas vezes vá sozinho...

Travam em meus ouvidos, cantos mis,
Quando harmoniosamente estrelas giram;
Eternos carrosséis, loucos, febris...

Sonhadores formatos da natura...
Meus olhos tresloucados... Sim, deliram...
Eu respiro em teu hálito a loucura...

X


Toda vicissitude que carrego,
Fomentos de uma algia na lembrança
Performaticamente já me alcança
Mostrando um duro algoz: caminho cego;

Tantas boçalidades. Não relego
A um plano inferior, mas mudança
Se faz como instrumento de esperança,
Quem sabe me trará paz e aconchego.

A palavra é meu único instrumento,
Porém tem fino corte de navalha.
Precedendo a qualquer um movimento

Ascendendo ao poder de uma batalha.
E tenho em ti, amigo um aliado
Na luta que perfaço amortalhado...

X


Jamais conceberei ser evitável
O cancro que me invade por inteiro.
Na pútrida matéria descartável,
Exposta a várias cores do tinteiro;

Encontro meu destino inconsolável.
Vagando por amor tão “verdadeiro”,
As marcas deste rumo maleável,
Fagulhas que me queimam, vil braseiro...

Vestiste de pureza, podre atriz.
Nos ritos dos amores, foste vã.
Horrenda e tão profunda cicatriz...

És verme que minha alma creu divina,
Escondias pendores, cafetã
Disfarçada nos ares de menina...

X


Cadê minha Tereza, foi pro mar...
Quem era ventania, virou brisa,
A morte traz medida mais precisa.
Quem fora majestade? Sem altar...

Depois dessa viagem, foi parar
Onde toda maré se torna lisa...
Tereza, bem distante, o mar avisa,
Que nunca poderei mais te encontrar...

Perdoe se não pude nem sentir
O que pensei doesse. Vou pedir
A Netuno que nunca mais te veja...

É tudo que minh’alma mais deseja,
Tua cabeça traga na bandeja;
Nem quero teu cadáver prá carpir.

X

Quem dera se tivéssemos o canto
Que já foi esquecido pelo povo...
Justiça envergonhada fecha o manto,
Os velhos rapineiros estão de novo

Tentando exterminar dentro deste ovo
Abortam simplesmente todo encanto,
Pois tentam ressurgir com velho estorvo,
Espoliando tudo, nosso espanto...

Quem foi tão massacrado, noite escura;
Às vezes se esquecendo o que passou,
Juntando-se aos servis da ditadura,

Que fazem? Por que tanto se lutou?
Procuram na doença a sua cura,
Esquecem do dragão que a causou...

X


Maturidade chega com a tarde,
Os meus cabelos brancos são emblemas.
A vida vai passando sem alarde
Não posso me esquecer de velhos temas...

Nas dores que vivemos, fui covarde,
Agora que envelheço, em outros lemas.
Por mais que sempre tente não retarde
O tempo não tem pena das algemas.

Nessa melancolia, meu retrato...
Ansiedade louca sem remédio.
A morte aproximando-se é um fato.

O mundo vai murchando pouco a pouco...
Não posso resistir ao duro tédio
Maturidade chega e fico louco...

X

Desejo a ti: feliz aniversário
Que a vida te sorria mansamente.
O mundo tantas vezes temerário
Talvez se modifique totalmente

O sino rebimbando, o campanário
Está comemorando, pois pressente
Que este dia trará ao calendário
A marca de mudança e de repente

Se o homem perceber que nesta data
Alguém já poderá nos mitigar
A dor que se demonstra todo dia,

Assim a vida mostra e me arrebata
Trazendo mil motivos pra brindar
Com toda uma emoção, tanta alegria...

X


Sabendo que o porvir é tão incerto
Que às vezes se fará em triste frio,
Se disso, companheira, eu desconfio,
Meu passo nos teus braços eu acerto.

Por mais que o mundo traga desconcerto
As águas turbulentas deste rio
Se acalmam noutras margens, noutro estio.
Oásis salvador de tal deserto

Tua amizade paira, deslumbrando,
Tornando meu futuro de outro jeito
Promessa que se faz e sem demora

Demonstra na verdade, aonde e quando
O dia nascerá mais satisfeito,
Na força da palavra redentora...

X

Quem sabe desta vida, o seu engenho
Percebe quão são duras as andanças
Embalde tantas vezes, esperanças
Resumem, no final, de onde eu venho.

Se toda uma alegria assim mantenho
Pensando nas noturnas, boas danças,
Percebo que talvez as temperanças
Demonstrem ou resumam o que eu tenho.

Embora tantas marcas dos desgostos
Uma esperança ainda resta na alma.
Promessa de talvez, tranqüilidade...

Ao ver serenidade em alguns rostos,
E pressentindo um sonho que me acalma
Encontro lenitivo na amizade...

X


Falando deste amor tão docemente
Em termos mais felizes, namorados.
Andando em liberdade, alcanço os Fados
E deixo que este sonho me avivente

Quem anda tão distante qual demente
Não sabe destes laços bem atados
Tampouco destes sonhos desfraldados
Que invadem seduzindo nossa mente.

Amar é ser feliz e ser honesto,
É ter solicitude, estando presto,
Voar sem ter as asas milagrosas.

Amar é ter engenho, saber arte,
Estar em pensamento em toda parte
Aonde recender olor de rosas...

X

Amor que em tanta luta estende o braço em prece
Trazendo
em esperança um breve pensamento
Amor nos atormenta e salva em um momento.
Um coração se mostra enquanto lhe obedece.

Se amor ao nos tocar, aviso já nos desse
Talvez assim já fosse a vida um só tormento
Amor não se prediz, é livre como o vento,
Seu passo pela vida, a própria sorte tece.

A quem amor se mostra? A quem está sujeito
A toda esta benesse: um sonho mais perfeito.
Não deixe que este amor que agora enfim te toca

Se vá insaciado, isto seria trágico.
Pois somente ele nos mostra um mundo novo e mágico
Aonde a claridade apraz e se retoca...

X

No meu cabelo ao vento, quero pente,
Na minha mão sedenta, peço luva.
Como é cruel sentir a dor de dente,
Choveu mas esqueci meu guarda chuva...

Mordendo, teu veneno de serpente,
Quando passas, renovas passas, uva...
Como enxergo? Dos óculos és lente,
Nas baladas, embala enquanto groova.

Nem versos meus, conversas jogo fora...
Na partida parida pela guerra.
Se tanto quis outrora, quero agora.

Não sei bem certo, tudo que me encerra.
Só sei que no teu corpo – amada - aflora
O templo mais gostoso desta terra...

X

Pútridas as manhãs
Às vésperas da morte
Sem vida ou amanhãs
Dispenso toda a sorte.

Vidas. Prá que; se vãs;
Vasculho cada corte.
Dores em noites cãs
Raios de duro porte.

Esqueço estas palavras
Forjo minha cantiga
Morte que traz em lavras

A
companheira antiga.
Quem dirá que são parvas
As urzes da caatinga...

X

Buscar a claridade em cada noite...
Ser vão e companheiro da verdade.
A noite perspicaz me traz açoite
O vento de meus sonhos, u’a saudade...

Não posso conviver com tanto engano,
Nem posso me deixar ao desatino...
O medo renovando torpe plano,
O canto da sereia é meu destino...

A minha alma procura por saída,
Nos teus braços remansos e delícias...
Venerando total e leda vida,

Já busquei por teus passos, nada encontro...
Desfrutei liberdades e malícias,
Nossa vida é completo desencontro...

X

A dor se anuncia bruta,
Dor cruel que me destrata
A vida merece essa luta
Os brilhos desta cascata

Do meu peito colho a juta
Que plantaste, dor ingrata.
Tuas mãos, triste batuta,
Embrenham na minha mata.

A dor que fora primeira
Fez descanso no meu peito
Minou minha vida inteira

Não restou nem o direito
De buscar a companheira
Que me deixe satisfeito...

X

Brindo outra vez, teimando no martírio,
Bem sei que me fugiste, sem perdão...
Busquei-te nas campinas como a um lírio.
O que causava inveja a Salomão...

Não mais esquecerei, nem em delírio,
As mãos que me afagavam, com paixão...
Não resta em meu altar sequer um círio
Qual fosse o coração, ateu, pagão...

Não mais quero tratar amor tão tétrico,
Nem quero percorrer teu céu sem lua.
Nas minhas serenatas, assimétrico,

O canto repetido te faz nua.
Meu verso vai quebrado, não é métrico.
Por isso tão distante alma flutua.

X

O brilho do luar que já fulgia
Nas ondas deste mar demonstram Deus...
Na corte desses deuses resplendia
Nos sublimes altares fosse Zeus...

Delirando com néctar e ambrosia,
Os amores tivemos tão ateus...
Nos Olimpos nos Édens cercanias.
O brilho que roubaram, olhos teus...

Amada se não vejo teu sorriso,
De que me servirão meus pobres versos...
Não pude conhecer no paraíso,

Nas várias vastidões dos universos.
Nos campos e galáxias mais dispersos.
Não há nada no mundo mais preciso.

X

Nossos sonhos, qual torres protegidas
Pelos deuses d’amor e pensamentos,
Se elevam levam livres movimentos
Carreiam cordilheiras, nossas vidas...

Nos andores, condores, despedidas,
Flutuam no sonhares meus tormentos,
Queixando-me, percebo tantos mentos
Tremendo, indo temendo as recaídas...

Nossos sonhos, discípulos, Morfeu,
Penetram nas penumbras, nos umbrais,
Deixando leve, breves festivais;

Por onde ondeavam maremotos,
Motivos e matrizes, modos, motos,
Remotos nossos sonhos, sorvem breu...

X

No braseiro da tarde de verão,
Adormecida sonha com luares.
Delírios inconstantes, turbilhão,
Alcançam ferozmente seus sonhares...

Desgrenhados cabelos, multidão
De desejos transbordam nos altares
Escondidos no casto coração...
Cáusticos martírios loucos ares...

A mão que percebia sobre o seio,
Os dedos acalmando tal braseiro.
O mundo se desfaz em devaneio.

Nos rastros das estrelas, tanta sede.
A vida é um retrato na parede,
O sol tão penetrante, companheiro...

X

Carrego estas tristezas no bornal
Herança que virou um duro fardo.
Nos caminhos que passo, tanto cardo,
Vagando em solidão, mar abissal.

Toda noite o vazio dá sinal,
O mundo nebuloso, um sonho pardo.
As dores desfilando em festival.
Solidão companheira, triste fado.

Meus males- as malas que carrego-
Não sei porto algum nem descarrego
A saudade que insistindo se avizinha.

Pesado; mal caminho e sigo triste,
Um sonho pirilampo não resiste...
Tanta dor neste mundo... Sempre minha...

X


O fogo da paixão que tanto ardia
Moldando uma esperança onde prevejo
Virá com mais ardor nosso desejo
Alçando um novo tempo em alegria.

Apenas em carinhos se previa
Um mundo mavioso e tão sobejo,
Levando ao desencanto, o seu despejo,
Pois num canto se irmana a cada dia.

Nas chamas atrevidas, mais audazes,
Os lábios tão gulosos são capazes
De tantas peripécias num momento.

Enamorados vamos pela vida,
Reféns da fantasia que incontida,
Domando nos encharca o pensamento...

X

Viajando ao terreno das promessas,
Não posso me furtar a ver teu rosto.
Nas fontes que bebi, em todas essas,
Não sorvi senão dores e desgosto...

Erraste, bem sei, louca me confessas,
Mas nunca mais terei um novo agosto,
Vencidos os venenos, pra que pressas?
Rei morto vem trazendo um novo, posto!

Amor, cadê teus olhos? Não os vejo...
Minha porta entreaberta não disfarça;
Se foste rato, sempre fui o queijo.

A peça que se finda, velha farsa;
As noites que perdi, cego desejo,
Deixaram, tão somente, esta carcaça!

X


Mirraste tantas mãos que acaricias,
Verdugo que delira em crueldade.
Devoras sem temer, as fantasias...
Prazeres histriônicos, maldade...

Chacinas, aos teus olhos são orgias,
Despertas violências... Ansiedade
Demonstras quando vês torturas frias...
A morte que revelas cedo ou tarde!

Nas páginas sangrentas do jornal,
Ao delírio te levam tais notícias
Carnificinas trazes no bornal...

És pântano sedento de sevícias...
Abutre que deseja tanta morte
Aprofundando sempre imenso corte...

X

Quando vou caminhando pelas ruas,
Muitas vezes me sinto machucado.
As pedras do caminho, duras, nuas,
Adentram pouco a pouco em meu calçado

Quantas vezes, sofrendo dores cruas
Nas curvas do caminho. Vou de lado.
Depois de ter perdido este solado,
Ó pomba, quanta inveja, pois flutuas.

Quando vejo mulheres, tão bonitas,
Calçando um improvável bico fino;
Ao bom Deus, pergunto: como acreditas;

Ser possível tamanho desatino,
Espremendo assim demais, arrebitas
Os cinco pobres dedos, num só pino...

X

Os anjos que me beijam, compassivos;
Nas trevas e tabernas, tabernáculos...
Nas horas, orações, hordas, oráculos...
Deitados, languidez, os faz lascivos...

Os anjos, com seus seios, meus cativos...
Eu tento novo intento, seus tentáculos!
Eu espero espreitando os espetáculos.
Carinhos, meus caminhos decisivos.

Os anjos se guardando para a festa,
Idílio, novo exílio, quero a fresta
Por onde todo amparo faz-se trágico.

Os anjos penetrando os sentimentos,
São banjos, seus arranjos, meus momentos.
Encantos de esperança, canto mágico!

X

No canto deste canário,
Encantos dum bem te vi
Natureza traz cenário
Beleza igual nunca vi.

Tristeza deixei n’ armário
Essa dor já esqueci...
Amor bom é solidário
Amor que nunca perdi.

No canto do trinca ferro,
A saudade deu um berro
Eu fiquei triste e tão só.

Cantando esse passarinho
Saudades tem do seu ninho.
Meu amor é curió...

X


Não poderei ouvir o canto desta mata,
Nos frutos que preparo, as mãos da deusa Flora.
Nas hastes desta flor, no véu desta cascata,
A mãe natura em vão, ao homem tanto implora.

A lua traz decerto o brilho desta prata.
Percebo essa promessa, a natureza chora.
Quem ama não destrói, namora em serenata.
Quem sabe não discute agora, faz a hora.

Vestígios de queimada, anseios de vingança.
A fonte da vitória afoga essa esperança.
O mote que me deste enfeito nesta trova.

A mão que te tortura, um peso amargo e triste
O fogo te devora e mais tudo que existe.
Um homem não repara e cava a própria cova!

X

Escutava o teu canto, longas noites...
E não tinha sequer as evidências
Lograva tais insanas penitências
Penetrantes, ardentes; feito açoites...

Não queria, mas vinhas... Vis pernoites
A cada instante; mágoas sem clemências,
A cada canto lúbricas demências...
Cantavas, procurando quem te acoites...

Nada mais me restou, zero ambulante
Os meus dedos, crivados por teus dentes
O que me sobra? Andar qual mendicante.

Farrapos que se seguem, de dementes
Sem amanhã; sem nada vou adiante?
Sem ironia, diga-me o que sentes.

X



Cantilenas da frota
Corsário sem sentido,
Saudade que me corta
Noutras noites, olvido

Senda que segue torta
Sonho que vai perdido
Felicidade morta
Não ouviu meu pedido.

Escarpa? Eu não pulei
Meu barco naufragado
Mar que não naveguei

Canto desesperado
Amor que foi minha lei
Deixando-me de lado...

X

Cadáveres carrego, bem pesados...
Amores e saudades sempre voltam
Nos sonhos, pesadelos, sinas, fados...
Tantas horas perdidas me revoltam

Pés cansados, imersos, afogados
Em plena comunhão, vultos escoltam...
Nas mantas, meus temores abrigados
Precisam de tais nuvens que se envoltam.

A vida foi passando de viés,
Saudades e esperanças; o que eu trago.
O mundo que pensei atou meus pés

Carrego minhas dores – turbilhões...
Todos os meus cadáveres; afago.
Cansaço de quem leva multidões!

X


Fadas e gnomos, frágeis criaturas
Siderais te acompanham, nem percebes...
As delicadas bênçãos e ternuras
Estão a cada passo que concebes...

Nuvens, borrões celestes, nas alturas,
Observando teus passos nessas sebes,
Lacrimejam-se plenas, ficam puras,
Trazendo as doces águas que recebes...

Sedenta de carinhos, livre lebre,
Saltando por meus sonhos, nas campanhas,
Ardendo teu amor em louca febre,

Os olhos que te querem... pirilampos;
Nas altas cordilheiras, nas montanhas,
Procuro teu amor por belos campos...

X

Caminho sobre urtigas, urze, erica...
Meus passos se perdendo neste pasto.
Fulvos, os meus desejos, vida rica,
Nos peitos delirantes, sonho casto...

Não posso nem pedir, mas sei que fica
O gosto da saudade, amor bem gasto
As luvas dos meus sonhos, sei pelica,
Nos versos, minha vida já contrasto...

Nas pedras, corredeiras, seixo e lodo...
Os caules dos arbustos espinhosos;
Pairando sobre mim, um triste engodo...

Nas fontes exauridas, mato a sede...
Perfumes que pensei ter; olorosos,
Meu sonho? Estar deitado em uma rede...

X

Caminho Santiago, Compostela,
Nas rotas dos romeiros Juazeiro.
Nos raios deste sol, ventos e vela.
No mundo dos migrantes, um luzeiro...

Nas rezas nas oradas, na capela,
Amor que se derrama verdadeiro.
Esperança que sangra se revela,
No pátio deste mundo sorrateiro...

Aparecida traz seu santuário,
Os homens agradecem, procissão...
Nas rias das urgências estuário...

No medo se comprova a devoção.
As tristezas guardadas num armário,
Esperança acalenta um coração...

X

A minha alma ecoando busca a tua,
Nessas fráguas, as mágoas queimam, tanto...
Amiga, me permita teu encanto,
Talvez, um dia, venhas bela e nua

Nas noites que imagino, minha lua...
Respiro seus venenos, lentos, pranto...
Amor divino, cego, louco, santo,
A cada dia, a dor vem, continua...

O vento e madrugada, nova dança;
Nas estradas, atalhos d’esperança
Levam ao nada, nada, simples nada...

Caminhemos distintos caminhares,
Naveguemos por mares, por vagares
Que, afinal, voltarão por essa estrada...

X

Caminhante perdido sem ter trilhos,
Desconforto gigante em impotentes
Passos
que se fazem andarilhos
Buscando outro caminho, outras vertentes.

Encontro na verdade os empecilhos
Comuns da miopia que sem lentes
Confunde seus amigos com caudilhos
E rosna pra quem ama, unhas, dentes...

A sonda que lancei, sem ter resposta
Sonares se perderam neste mar.
Porém pele curtida cria crosta

E aos poucos se transforma na couraça
Que penso proteger do que encontrar...
Só resta uma saudade e a vida passa...

X

Meu verso se encontrou em plenitude
Dizendo
simplesmente todo o sonho
De ter sempre o bom senso e juventude
No que se fez completo e bem risonho.

Que o tempo nos impele e nos ilude.
Um mundo bem melhor: eu sempre sonho.
Decerto em outros templos tudo mude
Porém quero um viver menos tristonho.

E digo deste modo,o que pressinto
Sorvendo todo o mel que me permites.
Concedes teu prazer, desejos, sinto.

E quero ser só teu. Em todo verso
Demonstro sentimento sem limites
Vencendo o duro medo de ir disperso.

X


Moleque quando andava nas calçadas
Bem reparava a bela que subia,
As saias pelos ventos levantadas
Deixando a molecada em euforia.

As frutas dos vizinhos, se roubadas
Traziam para a turma uma alegria,
Depois nos campos- várzeas, as peladas
A gente foi feliz, disso eu sabia.

Agora uma barriga que é burguesa
Se lembra das lombrigas e cupins.
A mãe chamando a turma para a mesa,

Café com broa, pão, doce de leite.
Bermudas de Tergal, nada de jeans.
Viver era tão bom: doce deleite...

X

Caminhando busquei novas manhãs.
Os ventos tempestades me queimaram...
As mãos se esfarraparam, foram vãs,
Os tiros e canhões dilapidaram...

Nas tentações profanas das maçãs
Dos sonhos, pesadelos me sangravam
As noites solitárias são malsãs
Meus sonhos – liberdade - já calaram...

Os dias que se mostram mais saudáveis
Rapinas, tentam loucas; destruir.
As dores se tornando insuportáveis,

Vorazes, as tristezas não disfarçam
E querem nosso amor já destruir...
Bicos esfomeados, tudo caçam...

X


Camaleão audaz mudo de cores.
Em tardes eu vou blue, negro noturno.
Carrego inda comigo meus amores.
Meu passo numa espreita sói soturno

Levando como cargas,dissabores.
A vida transtornando cada turno
Plantei felicidade colhi dores,
Nos porões de minha alma eu já me enfurno.

Coração tão vira-lata rebate
Nas madrugadas frias, triste, late.
Uivando em dissonância, a noite traz

Um pesadelo enorme, mata a paz
Amores sem vergonhas ou verdades
Transparecendo cedo as veleidades...

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