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Thursday, February 4, 2010

24135 até 24148

5


Ao largo destas ondas, levo o barco
Vencendo as intempéries; mansidão.
Sabendo desde sempre o que farão
As torpes ilusões que não abarco,

O quanto se mostrou na vida parco
O sonho ao ver ao fundo esta amplidão
E nela propriamente a negação
São como setas frágeis para um arco.

Não posso me levar por tais sinais
Aquém do deveras desejais,
Se vós tendes nas mãos a liberdade.

Vos servido não temo outra manhã
E sei que uma mudança tola e vã
Não é o que deveras mais agrade.


6


Às vezes de esconder claros defeitos
Eu sinto ser real necessidade,
Por aonde esta saudade chega e invade
Os sonhos na verdade estão desfeitos.

Encontro a solidão de velhos leitos
E neles a total tranqüilidade
Embora tal retrato se degrade,
Não faço de ilusões sequer meus pleitos.

Apenas quero se feliz e entanto
Ao longe no vazio inda me espanto
E tento sem sucessos ver a luz;

Pois onde no passado houvera penas
Agora se em perdão e paz acenas
Deveras falso brilho não seduz...


7



Se desgraçadamente a mente engana
E tudo o que se vê não tem razão
Apenas simples sombras ficarão
E o tempo traz uma alma soberana

Aonde se mostrando mais profana
Uma alma se entregando sem perdão
Não sabe se inda resta a solução
E quando se aproxima desengana.

Vencer os meus delírios e seguir
E mesmo que não creia num porvir
A vida por si só encanta a quem se dando

Não teme os dissabores nem tristezas
Além do que deveras inda prezas,
As dores se aproximam; turvo bando...

8




Um corpo sem sentidos, vão e inerme
Aonde se pudera crer na sorte,
E quando sem ter luz que me conforte,
Não posso mais sequer talvez; erguer-me.

Além do que pensara sei que ver-me
É como ter nas mãos a fria morte,
E enquanto houver um canto que comporte
Não vou ser devorado por tal verme.

Não quero a placidez que me apascente
Uma alma se demonstra mais ausente
Se tudo o que inda quero não consigo.

Viver só pelo fato de poder
Aos poucos descobrir o que meu ser
Procura além de cais, comida e abrigo.


9


O peito em carne viva poderia
Ao menos ser talvez mais dócil, pois
Enquanto se mostrara sem depois
Expressa no final a fantasia.
Mergulho neste mar onde a agonia
Extrai cada momento de nós dois,
Não dando nem sequer o nome aos bois
A morte noutra vida se recria.
Acende esta lareira após. Senão
Falenas noutro campos volverão
Mudando a sorte imensa de revê-la.
Esgoto-me deveras no que eu disse,
Embora tanto amor seja tolice
É nele que aprendi conter estrelas...


10


As mãos que se cruzando sobre o peito
De um velho sonhador dizem promessas
Audazes que mal tornas, recomeças
E sabes onde escondo o nada feito.
E enquanto estas versões eu não aceito
Sabendo que deveras vivas; essas
Ilusões pelas quais quedas; tropeças
São peças arrumadas sem ter jeito.
Não posso se, enfadonho, busco ao menos
Os dias em que possam ser serenos
Os cortes mais profundos que me deste.
Por mais que não consiga outra versão
Senão esta nefasta comunhão
Da vida com o solo mais agreste.


11



Metido com as mãos erguidas tendo
Apenas este céu por referência
E quando se demonstra a preferência
Não vejo noutra fonte algum adendo,
Se todo o meu caminho assim desvendo
E entregando a minha alma; pois, convence-a
Que ao fundo não verás sequer clemência
No olhar de quem se fez mesmo não sendo.

Escrevo cada verso feito apenas
Por ter necessidade de contar
Além destas estrelas, do luar
Aonde e em que caminho tu serenas
E roubas; logo, as cenas, fato incrível
Do amor que antes julguei ser implausível.


12


Desfila sobre o leito agora o que
Deveras não sabia ter qual alvo
Um dia em que pudesse estando a salvo
Saber desta verdade o que não vê.

E tendo sem desculpas nem cadê,
Auto-controle enorme é que ressalvo
De cada monte o cume, mesmo calvo
E nele em escaladas, céu se crê.

Estrelas e disfarces onde a lua
Deitando sua prata continua
Reinando sobre toda a noite em luz.

Esgoto-me no quanto não consigo
Viver a poesia como abrigo
Que tanto me maltrata e já reluz...


13


Pairando sobre as almas, vejo as asas
Abertas das estúpidas quimeras,
Aonde na verdade não esperas
São presas teorias em que embasas
As vidas como fossem meras brasas
Que o tempo muita vezes destemperas,
Deixando em teu olhar, pródigas feras
Enquanto refugias noutras casas.

Não posso desvendar sabendo a teia
Aonde se enovele o que incendeia
E toma em fogaréu a cercania.
Acerco-me das armas que inda tenho
Mostrando desde cedo o meu empenho
Na luta amortalhada que se cria...


14



Enquanto cantas vida e riso e gozo,
Ainda não me cabe este prazer,
Aonde se mostrara algum viver
O tempo se moldara caprichoso,
Vivendo a fantasia e desditoso
Caminho que procuro, posso ver
O quanto desnudando um vago ser
Apenas mostra o rosto belicoso

De quem se fez mortalha em plena vida
E mesmo que talvez em descaída
História se refaça vez em quando,
No fundo meu cantar trazendo a morte,
Não tendo quem deveras mais suporte
Um mundo noutro canto disfarçando...

15

Cantasse em ironia festa e luz,
Seria na verdade sempre falso,
E quanto mais profundo o cadafalso
A treva sem demoras, já conduz

O velho caminheiro reproduz
Em versos o que ainda usando calço
E quando a realidade turva eu alço
Levando a mais pesada e dura cruz,

Servindo de mortalha a tais abutres
Que insaciavelmente ainda nutres
Com gozo de esperança tola e tosca,

A sorte que se aufere em fogo e chama,
Por vezes de outro mote inda reclama,
Porém a minha noite segue fosca...



16







Passado que em futuro não traduzo
Expondo no presente a solidão
Bebendo desta estúpida ilusão,
As cores que revejo, reproduzo.
E sendo que não posso, mas reluzo
Em plena negritude, pois virão
Tomar já totalmente a embarcação
Moldando a cada passo o mesmo abuso.

Não ter outro caminho e ser assim
Diverso do vazio de onde vim
Mereço pelo menos um momento
Aonde não se faça só promessa,
Mas quando a vida vem e recomeça
Nas ânsias do vazio, eu já me alento.




17



Entorna-se deveras este caldo
E quando não pudesse ter nos dias
Além do que este vão que prometias
Restando neste escombro algum rescaldo.
E quando noutra sanha eu me rescaldo
Esqueço do quer foram fantasias,
E sempre que procuro, mais adias
Numa incerteza tosca, enfim me esbaldo.

E tenho que lutar contra o não ser,
Queria simplesmente; mas poder
Decerto não tem nada com querências.
Aonde se mostrara algum sorriso,
Espanto-me, pois mais do que preciso;
As horas se moldando em imprudências...



18




Presente está pior do que o passado?
Talvez, mas se não creio no futuro
Enquanto em trevas luzes que procuro
Mergulho neste abismo, abandonado,
Vivendo o que não sei ser cruz, pecado,
Pesando a cada dia o chão mais duro,
Pisando neste vale em céu escuro,
O tempo que pensara, desolado.
Rasgando os velhos tomos deste livro,
Dos meus fantasmas, todos, eu me livro
E solto as mãos em busca do que outrora
Pensara ser possível, mas sei bem
Que nada vezes nada, o que contém
O mundo que buscara sem demora.

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