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Tuesday, April 25, 2006

COMPREENDE AGORA SEU DOUTOR?

Meu canto de amor à terra, passa por teus braços, pelos laços primitivos entre o homem e a civilização, e também pelos derradeiros.
Mãe, terra mãe, tenazmente guerreira, contra intempéries e sofrimentos, nas tuas mãos passaram os cadáveres de seus filhos abandonados à própria sorte; para ti,a morte, se tornara corriqueira companheira. Nos teus olhos marejados de saudades, a esperança, mesmo que ofuscada, nunca perdeu espaço; um dia há de melhorar, velha cantinela, velha sentinela de seus homens e mulheres, meninos e meninas, velha amiga.
Nas mãos a enxada e a foice, nos pés os cravos e nas mãos os calos, além do terço indefectível.
Os pés cansados traziam o corpo marcado pelo sol, e as mãos cheias de lenha, calor de fogão, a brasa refletida no teu rosto avermelhado.
Campesina, camponesa, lavradora, teus cantos me levam aos reinados, de princesas e crianças, como eu, como tantos, rondando perto de ti, à espera de um torrão doce ou de uma história meio triste de final alegre, pois sempre a esperança era heroína.
Nas horas do ócio, sentada na sala, contando o dia, ou mais ainda, ouvindo do meu velho pai, seus folguedos de menino, herói convicto, com suas fábulas e bravatas, meu velho pai, que a vida levou e me deixou saudades...
Na hora da missa, a gente se reunia, mamãe levava todo mundo, temor a Deus e respeito ao Coronel, o mais perto de Deus que a gente pensava poder chegar - Toma benção menino; seu Coronel, seu padrinho...
Hoje sei o quanto meu povo fora explorado por aquele homem de rosto seco e cara fechada, chapéu de couro e botas compridas. Homem com cara de mau ou, pelo menos a cara do medo; tinha hora que parecia deus, outras vezes eu o via como o diabo; de qualquer forma me metia medo.
Hoje, mamãe está velhinha demais, já não tem forças e nem se lembra direito mais quem ela é, do meu pai, nem sabe se existiu, a vida apagou todas as suas lembranças, nem a esperança mais restou, a lucidez ao se ir, levou tudo...
Sorte dela, muita sorte...
Seria difícil para ela entender que, por causa da terra, da bendita terra que nunca foi nossa, só restando uma palhoça pra poder descansar, a minha irmã caçula, Martinha, atrás do sonho da dignidade, em busca de um canto de terra, para poder cultivar, sem dar obediência a Coronel, nem a Deus nem ao Diabo, simplesmente poder arar em paz, viver em paz e criar meus sobrinhos em paz; ontem foi assassinada...
Os jagunços dizem que o marido dela atirou primeiro; como, meu Deus?
As armas deles sempre foram as mãos calejadas e uma foice e uma enxada, atirar como?
Quando acabei de ouvir a notícia na televisão, dizendo que os trabalhadores sem terra tinham começado a confusão e, aparece a cara do jagunço, dizendo essa mentirada toda que eles sempre inventam e, o comentarista disse, cara de moço que nunca pegou numa enxada, que a culpa era dos lavradores, e criticou o presidente por não tomar atitude; seu moço, o troço veio subindo minha goela acima e não resisti...
Ainda por cima veio um cidadão chamar minha irmã e meu cunhado de bandido...
Entendeu agora porque eu joguei esse safado de cara para o aparelho de televisão?

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