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Monday, September 4, 2006

Quem vê cara...

Ritinha era muito gulosa e isso tinha suas conseqüências. Adorava frutas, qualquer tipo de fruta. Principalmente jabuticaba.
Não sossegava enquanto não se empaturrava dos pequenos frutinhos saborosos e suculentos,
Dona Rita tinha cansado de avisar que não engolisse os caroços; e Ritinha obedecia fielmente.
Outra fruta que gostava muito era goiaba; tanto da branca quanto da vermelha; muitas vezes ignorava se tinha ou não os costumeiros bichinhos que iam parar no estômago da voraz petiz.
Ibitirama estava crescendo e isso significava melhoria da saúde e da educação. A inauguração de um pronto socorro tinha sido motivo de vários dias de festa, com a presença do Secretário Estadual de Saúde, inclusive.
Entre os médicos que começaram a trabalhar no pronto socorro havia alguns bem famosos, como o doutor Norton Fagundes e o doutor Pedro Elias, lá de Guaçui.
Havia também uma jovem médica, vinda de Vitória, dona dos seus vinte quatro anos de idade e zero de experiência.
Impecavelmente vestida, usando um jaleco todo branco, daqueles que são obtidos com muito anil e muita força nos braços da lavadeira.
Naquela tarde haveria a inauguração oficial do Pronto Socorro e a doutora estava mais do que nunca, enfeitada e limpa, impecavelmente limpa.
Paralelamente lá em Santa Martha, totalmente alheia aos festejos, Ritinha dona dos seus seis anos e de um rosto angelical cobertos por um cabelo louro e com bochechas rosadas, um exemplo raro de beleza e inocência.
Inocência e teimosia, naquele dia fizera a festa. Comera goiaba e jabuticaba até não poder mais.
Tão empolgada estava que nem reparou nas sementes, devoradas com toda a sofreguidão possível.
Depois de tal repasto, não deu outra. A barriga começara a doer, e doer muito.
Dona Rita até que tentou paliar levando ao farmacêutico local mas, em vão.
Esse então, se lembrou que o Pronto Socorro já tinha sido inaugurado.
Dona Rita, toda envergonhada, pegou a menina e desceu com ela para Ibitirama.
A festa estava animada, com banda de música e tudo mais.
Ao ver Ritinha chorando e gritando de dor, o enfermeiro de plantão querendo mostrar serviço, mandou dona Rita entrar que a doutora Lenice iria atender a menina.
O Secretário de Saúde, ao ver a beleza da menina se encantou e, médico que era, resolveu ajudar a pobre garota.
A doutora, por sua vez, doida para mostrar serviço, se apressou a chamar a pequena paciente para ser atendida.
Ao saber do motivo da dor, não se fez de rogada; pediu para que a menina ficasse de quatro e começou, com uma pinça, pacientemente, a tirar semente por semente o enorme bolo fecal que se formara.
Num certo momento, a montanha começou a dar sinais de desmoronamento, mas a doutora entre distraída e embevecida pela presença do Secretário Estadual de Saúde, não percebeu.
Nem o primeiro e nem o segundo aviso.
Não houve o terceiro, a montanha desmoronou e atingiu em cheio a pobre médica, literalmente enfezada, o jaleco e o rosto principalmente. Alguns respingos atingiram o curioso e arrependido Secretário que, dizia entre dentes que nunca mais iria se deixar enganar por uma carinha de anjo.
Como diz o ditado popular: quem vê cara....

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